Nós humanos sempre sentimos ligações com nossos animais favoritos. Mogli – o menino lobo, Tom e Jerry, o Zé Colméia ou o ursinho Puff, assim como símbolos nacionais como o leão britânico, o castor canadense e a águia americana, todos dão testemunho desta verdade. Histórias sobre animais são atraentes porque os animais expressam características humanas e as pessoas se tornam heróis ao partir em aventuras com animais como seus fieis companheiros.
Os nômades se identificam com seus animais – não só como um meio de subsistência como na Ásia, mas também com afeição especial como muitos nômades africanos têm pelo gado. Os fulbe da África Ocidental descrevem o mundo em termos das cores de seu gado ou do formato dos chifres deles. Para ser aceito como um “autêntico” fulbe, espera-se que um homem seja um pastor experiente, e a morte de seu gado é motivo de vergonha. Os fulbe têm um código cultural de comportamento que admira as virtudes da paciência, respeito, modéstia, resistência, coragem, solidariedade e lealdade. Ao cumprir isto como um pastor nômade sábio, cada pastor é seu próprio herói! Na sociedade karimojong cada homem possui o nome de um boi, por exemplo, “Pai do boi com chifres pesados”. Isto concede status ao homem adulto na sociedade. Quando o boi está doente ou morre, o homem é considerado “doente” ou “morto”.
Ao redor do mundo, outras espécies têm importância cultural especial, como a lhama para os caravaneiros e pastores dos Andes, e o camelo para os beduínos por todo o norte da África e Oriente Médio. A rena é especial para os nenets e outros povos do ártico siberiano. O iaque é muito importante para os nômades tibetanos, que dedicam um animal no rebanho para os deuses, e o deixam para pastar e não trabalhar. Um iaque branco aparece em seus mitos como um animal divino. É considerado de bom agouro ter um animal assim no rebanho da família. Todas estas espécies ganharam um lugar de honra na cultura destes povos – porque eles sobrevivem em climas difíceis, fornecem leite e laticínios, couro, pelo, ossos, bucho e tendões para satisfazer a maioria das necessidades dos nômades e lhe dar autossuficiência.
Na Índia, os pastores gaddi do Himalaia e os pastores de camelos rabari de Rajasthan são devotos do deus Shiva, que, acreditam eles, lhes deu seus animais para que cuidassem. Os ferreiros Gadulyia Lohar, que vivem e trabalham na margem das estradas, nas suas carroças de boi, são devotos de Kali, a deusa da destruição, por causa de sua suposta covardia em face de um ataque muçulmano séculos atrás.
Mas há uma espécie acima de todas – o cavalo – que dá aos nômades sua mobilidade e uma imagem heroica. O cavalo permite que os mongóis, cazaques e quirguizes deixem os vales superlotados da Ásia Central e desenvolvam uma vida nômade nos vastos pastos da estepe. Livremente, sem fortificações, o cavalo também dá ao nômade sua única segurança, através de movimentos rápidos e ajudando-os a se reunirem em tribos. O nômade confia em relacionamentos, não em possessões – exceto pelo seu cavalo! Da Arábia à China, o nômade a cavalo se tornou uma máquina de guerra temida e admirada.
Os nômades como os índios do Brasil vivem influenciados pelos seus mitos sobre seus heróis, que se tornam divinos. Os heróis são considerados como ganhadores de particular graça ou poder, através de sua bravura, para ajudar outros em tempo de necessidade. Esta combinação de pastor robusto e pequeno cavalo robusto formava a cavalaria de Genghis Khan, que criou um império que abrangia da China à Europa Oriental. Ele teria cavalgado 100 quilômetros num dia, muitas vezes sem comida, e montado bonecos do tamanho de um homem nos seus cavalos reservas para dar a impressão de uma força maior. Hoje, crianças mongóis e cazaques aprendem a montar quase tão cedo quanto andar e participam de corridas cross-county a cavalo. Genghis Khan se tornou um herói nacional para os mongóis, por meio da bravura de seus cavaleiros, e hoje ele é uma figura conhecida e adorada,como um deus. Estátuas enormes o representam a cavalgo. No Xamanismo dos mongóis os deuses, os tngri, são adorados, dos quais o céu, tenger, é o mais alto. O herói Genghis Kahn é considerado a mais perfeita encarnação do tenger. O xamã é mediador entre os deuses e os espíritos e os homens.
Os tibetanos contam muitas versões da lenda do Rei Gesar de Ling, um tipo de George Washington ou Dom Pedro para eles. Ele nasceu, segundo se diz, por mágica. Sua mãe era uma pastora de iaque que outrora fora uma fada da água. Após desbaratar os ataques assassinos de uma rainha invejosa, o mordomo do rei e uma feiticeira com um olhar penetrante, ele e sua mãe foram banidos para os altos planaltos, onde ele cresceu e se tornou um caçador nômade. Ele se tornou rei ao ganhar uma extraordinária corrida de cavalos. Os tibetanos acreditam que ele ainda está vivo para ajudá-los nas dificuldades. Alguns exilados tibetanos estão tentando desenvolver uma visão mais secular da identidade tibetana, usando uma versão original do épico de Gesar, sem seus elementos budistas.
O herói é, acima de tudo, uma forma de salvação espiritual. Para o muçulmano, a vida e os tempos de Maomé muitas vezes são considerados a era de ouro a ser imitada. Porém, mais importante para os povos nômades da Ásia Central é a busca pelo baraka – um poder ou graça quase físico que reside no povo santo. Isto pode ser alcançado pela peregrinação até os pirs (homens santos muitas vezes alegando ser descendentes de Maomé) ou até os túmulos de pirs já mortos e carregando roupas ou outros objetos para absorver o baraka e “trazê-lo” de volta para casa.
Os tibetanos constantemente dizem que: “O Dalai Lama é nosso herói, o Buda vivo.” O Buda e os que estão ás margens da “iluminação” atingiram a “graça” por suas boas obras para dispensá-las aos que se esforçam através de suas reencarnações. Mais subversivos são os vários deuses tântricos que os lamas visitam em transe para aprender novos rituais de liberação do karma. Os tibetanos e mongóis tem uma busca incessante para ganhar méritos com rosários, rodas de oração e devoções.
Manas é herói cavaleiro dos Quirguiz das Ásia Central. A história dele com seu cavalo é contada e transmitida oralmente pelos manaschi. Estes se tornam manaschis após terem um sonho com os personagens do épico dizendo que elas devem seguir a profissão. Acreditam-se quando a história é escrita, perde seu poder. Conta como ele até voa no ar sobre seu cavalo mágico, derrotando seus inimigos e afirmando a identidade do povo Quirguiz. A universidade e o aeroporto de Bishkek e até uma planeta são dedicadas em seu nome.
Deus se revelou a Israel usando a figura de um guerreiro e cavaleiro cavalgando os céus para promover a causa de seu povo (Dt 33.26; Sl 104.3; Is 19.1), vindicar seus servos (Sl 18.10), capacitá-los a cavalgar (Dt 32.13) e fazer justiça aos vulneráveis (Sl 45.4; 68.4,33). O lugar de ação de Deus tanto é a sela como o templo ou o trono. Mas Ele não é exclusivamente o Herói de um só povo, mas está desenvolvendo seu propósito de reconciliar toda etnia a si mesmo. Vemos claramente a necessidade de apresentar aos nômades e aos índios o Herói dos Heróis, Jesus Cristo, um líder de homens, que montou em humildade num jumentinho, declarando sua vinda em paz e reconciliação. No lugar de mágica, ele dá amor e graça imerecidos. Em vez de agressão, ele dá coragem moral em face do sofrimento. O mundo não é um caos de conflito de poderes e heróis, imaginados pelos homens. Venceu os espíritos pela palavra dele; o inimigo dos homens não é os espíritos, mas no coração humano. Que importa é o relacionamento com Deus e a justiça. Ele é um amigo para os desprezados e sela seu cuidado com amor sacrificial para todos que confiam nele. Venceu a morte pela morte, pois o poder da morte não é natural, um processo inevitável, mas devido a rebelião moral e a culpa dos homens. Em vez de mérito incerto, ele dá perdão completo. Em vez de temer os heróis e os espíritos o homem vive em comunhão com o único Deus, viajando com seu único Herói Jesus.