Paumari — Pamoari

David J. Phillips

Autodenominação: Pamoari ou Paumari significa ‘nós’, do seu povo o coletivo étnico. Pode significar ‘freguês’ para com os comerciantes da região (Schröder 2002). Pamoari é usado em vez de ‘nós’ e os Paumari não usam os termos ‘nós’, ‘gente’ ou ‘humano’. Quando os regionais os chamam de Pamoari eles mesmos entendam isso de ser distinguidos dos outros índios que são chamados ‘caboclos’ ou ‘brabos’, e se sentem aceitos como aqueles adaptados aos modos dos ‘civilizados’ (Bonilla 2005.49).

Outros Nomes: Kurukurú, Palmari, Pamarí, Pammari, Purupuru, Wayai, Yja’ari (Scröder 2002).

População: 892(DAI/AMTB 2010); 1.559 (FUNASA 2010). 96 em uma só aldeia em 1964 e cresceram para 600 em 1996 em diversas aldeias no rio Purus (Cahill 2004).

Localização: Os Paumari vivem nos lagos e nas margens do médio rio Purus, Amazonas: A região do Lago Marahã 700 pessoas, no rio Ituxi (afluente direito do Purus) 100 pessoas, nos lagos do rio Tapauá, afluente esquerdo do Purus 200 pessoas (Bonilla 2005.41). Em diversas Terras Indígenas:

T. I. Caititu, homologada e registrada no CRI e SPU de 308.062 ha com 1.022 Paumari, Apurinã e Jamamadi.

T. I. Paumari do Cuniuá, homologada etc. de 42.828 há com 96 Apurinã e Paumari (FUNAI 2010).

T. I. Paumari Lago Manissuã, homologada e registrada no CRI com 63 Paumari.

T. I. Paumari Lago Paricá, homologada e registrada no CRI e SPU com 159 Apurinã e Paumari (FUNAI 2010).

T. I. Paumari do Rio Ituxi, homologada etc. de 7.572 ha com 235 Paumari.

T. I. Paumari Lago Maranhã homologada etc. de 118.766 ha com 1.076 Apurinã e Paumari (FUNAI 2010).

Língua: Paumari. O povo chama a sua língua pamoari. Pertence à família linguística Arawá. Os conhecimentos desta língua são conforme os estudos das missionárias Shirley Chapman, Mary-Anne Odmark, Meinke Salzer e Beatrice Senn, da SIL (Schröder 2002). Os Paumari usam entre si uma mistura de português com vocabulários paumari. Há três dialetos conforme as três locais (Bonilla 2005.41). Alfabetismo em Paumari é 70% (Cahill 2004).

História: No século XIX eram chamados os ‘Purupuru’ que na Língua Geral significa ‘pintados’, devido a uma doença do pele que causa manchas nas extremidades. São descendentes sobreviventes de uma secção dos Purupuru, agora extinto, que moravam no território entre a foz do rio Purus e a foz do Ituxi. Os últimos Purupuru eram mencionados na região acerca de 1850. Os Paumari são mencionados pela primeira vez em 1845 (Schröder 2002). Moravam em casas flutuantes em jangadas no meio dos lagos ou nas margens. Gostavam de cantar. Preferiam a negociar do que brigar e eram considerados pacíficos. Eram bons canoeiros. Viviam nas praias, expostos às ataques dos outros índios e depois sofreram a exploração dos regionais. Nas suas viagens nas praias construíam abrigos semicirculares simples. Eram atacados pelos Muras e fugiram em vez de enfrentar o inimigo. Os Paumari mudaram-se para a terra firme na floresta, e viviam uma vida seminômade entre diversos lugares conforme as estações do ano. Mas mantenham se à proximidade dos lagos e igarapés (Bonilla 2005.44).

São considerados péssimos caçadores, mas bons pescadores, pegando tartarugas e peixe com arco e flecha das suas canoas. O comercio em tartarugas e seus ovos ameaçava a sobrevivência do especie nos meados do século XIX. Os Paumari mergulhavam nove metros de profundidade para pegá-las, ou atraiam as com uma isca de fruta no superfície para pegá-las com lanças, ou dirigi-las muitas para a água rasa e as bater na água. Um viajante viu os Paumari trouxerem duzentos ou trezentos tartarugas por dia. Os ovos fornecem óleo para lampas e a cozinha. As carapaças serviam como baldes ou cortadas para fabricar pentes. A pele valia para pequenas bolsas de couro e carne era boa para comer. Neste comércio os índios sofreram exploração (Hemming 1987.242).

Na década 20 do século XX, Kenneth Grubb (da Missão Coração da Amazônia-M. Amem) comentou desta exploração que para os civilizados o mundo era divido entre os ‘Cristãos’ caraterizados por impiedosidade ilimitada e os ‘bichos da matta’, os índios, para ser tratado como tal (Hemming 1987.292). Os regionais diziam que a língua paumari era língua dos animais, e os Paumari ficaram envergonhados de a falar abertamente. Também as bebidas alcoólatras não eram parte da sua cultura, mas fornecidas pelos patrões, por isso a maioria dos homens tinham um problema de alcoolismo (Cahill.2004).

Poucos anos depois da expedições de descobrimento o rio Purus foi invadido por seringueiros por causa da abundancia de arvores havea. Os Paumari eram explorados por comerciantes que dominavam o rio Purus e 600 Paumari e Juberi (outro grupo sobrevivente dos Purupuru) foram vistos em 1862 obrigados a fazer uma grande roça para um comerciante. Na época da borracha os nordestinos invadiram a região, a cidade de Lábrea foi fundada em 1881 por um Cearense, Labre, que exploravam os índios pela extração do látex, peixe e quelônios. Parece que os Paumari se integraram no sistema de clientes e patrões sem muito resistência (Schröder 2002). Em 1889 120.000 ‘civilizados’ moravam no Purus e as cidades cresceram: 22.000 em Lábrea,15.000 em Canutama e 13.500 em Entemari (Hemming 1987.566 nota 292 citando Labre).

Os Paumari interpretam suas relações com outros em termos comerciais e de exploração, e querem se colocar como ’empregado’ em qualquer relacionamento. Seu interesse no comércio foi descrito pelos primeiros viajantes no rio Purus. Eles trabalharam conforme a estação com os seringalistas ou os madeireiros. Tornaram-se fregueses (pamoari) de diversos patrões e avançar o cumprimento da produção e o pagamento das suas dívidas. Eram explorados pelos regatões nos rios e acumulam grandes dívidas (Schröder 2002). Assim ganharam produtos industriais em troca de peixe salgado, quelônios e madeira principalmente, e às outras vezes andiroba, castanha, copaíba, seringa e sorva (Bonilla 2005.44).

Os jovens saiam da aldeia voluntariamente para trabalhar como seringalistas, madeireiros ou nos barcos dos regatões, assim aprendiam ‘o jeito do branco’ de negociar, falar o português, estabelecendo um relacionamento com um empregador que durava depois o jovem voltar par a aldeia e se casavam. Quando o relacionamento passou de freguês para ’empregado’ o vínculo é considerado pelo Paumarí de ser reciproco como padrinho e seu ‘filho’. Sofriam as ameaças, ‘castigos’ e violência na época. No fim da década 60 o sistema terminou com a chegada da FUNAI, a legalização das Terras e a chegada da SIL, que começou a providenciar os bens (Bonilla 2005.45).

Em 1964 quando Shirley Chapman e Mary Ann Odmark da SIL começaram a viver entre os Paumari a população era apenas 96. Muitos tinham morrido de sarampo e tuberculose, infecionados pelos regionais (Cahill 2004). O tempo dos missionários da SIL era considerado bom de condições de vida e de saúde, e os Paumarí sentiram abandonados depois da sua saída (Bonilla 2005.42, 56). A doença do pele, ‘Pinta’ que os Paumari sofreram era causada pela espiroqueta Treponema carateum. A doença foi erradicada pelas missionárias do SIL com administrações de penicilina. Também as missionárias os trataram e quase eliminaram o tuberculose, e treinaram paramédicos paumari. Em 1996 a população cresceu para 600 e ele não tinham vergonha de se chamar Paumari ou falar sua língua. A FUNAI vacinou o povo contra o sarampo (Cahill 2004).

Estilo da Vida: Os Paumari são pescadores e coletores dos frutos da floresta, e plantam roças pequenas de mandioca, cará ou inhame e bananas. Quando as águas estão baixas durante o verão amazônico usam as praias para mais plantios. Colhem as tartarugas e seus ovos. Vendem uma boa parte da colheita aos regatões ou aos comerciantes em Lábrea (37.000). Os grupos vivem com grande mobilidade conforme as estações e o nível das águas, a pesca é o método de sustento. A mandioca com 28 variedades, macaxeira, cará, batata doce, ariá, milho e feição são cultivados na várzea e na terra firme. Cultivam fruteiras e coletam frutas silvestres (Schröder 2002). Hoje em dia os Paumari cultivam diversas fruteiras e legumes e plantas medicinais e coletam frutas silvestres (Schröder 2002). Conservam tartarugas vivas em currais na água.

Artesanato: São dependentes dos produtos industriais e fazem comércio por estes com peixe, quelônios e castanha do pará, copaíba, látex e sorva. São explorados na troca e contraem grandes dívidas.

Sociedade: Antigamente os Paumari formavam clãs chamados os Povos da Lontra, do Jacaré, do Urubu e da Queixada, mas não há traços mais desta organização. Hoje os grupos locais dos Paumari não são clãs (madilha) nomeados por animais, mas apenas conhecidos pelo nome do lugar e são idealmente endógamos. A aldeia consiste de oito a quinze casas de uma família extensa. O fogo e a cozinha está na margem do lago perto das casas. Conservam tartarugas vivas em currais na água. Hoje a maioria moram em casas tipo regional na terra firme. Alguns moram em casas isoladas.

O casamento de preferencia era de primos cruzados. O genro trabalha para o futuro sogro antes do casamento. O casal mora por um mês com os pais da noiva e depois um mês com os pais do noivo e fazem mudanças constantes entre as duas famílias ate nascer o primeiro ou segundo filho (Schröder 2002). O relacionamento de patrão ’empregado’ predomina. Filhos adotivos ou de criação são considerado ’empregados’ pelos pais (Bonilla 2005.48). A adoção de netos pelos avos é marcante na sociedade paumari. As moças estão fechadas em uma casinha de reclusão depois a primeira menstruação por sete até doze meses. A reclusão termina com uma festa de toda a aldeia e o noivo já escolhido pelos pais começa a morar com a moça. Mas hoje em dia a escolha é dos jovens depois um namoro (Bonilla 2010). Tradicionalmente as aldeias não têm chefes ou caciques.

Religião: Os Paumari creem que os espíritos capturam a alma corpo (adonai) da pessoa e fazem a adoecer. Os pajés procuram a alma corpo (abonai) por tomar alucinógenos e o auxilio de cantoras. O pajé tem que negociar com os espírito que transformou a alma corpo em seu ’empregado’. Chuparam no membro do corpo, vomitaram a doença na mata, e voltaram com uma pequena criatura, alegando que fosse esta que provocou a doença (Schröder 2002).

A morte é captura permanente da pessoa pelos espírito e o abonai procede para o Lago da Renovação, situado rio acima no Purus e perto do rios celestes. Após um banho mágico os mortos são transformados com um novo corpo e podem escolher repousar em uma esteira e gozar a vida eterna no Lago, ou escolher a cadeira de balanço (símbolo do patrão) e se tornam em empregados do espírito do Patrão Chuva, buscando água das reservatórios no leste para derramá-la nas terras paumari. Assim o Patrão Chuva é considerado bom e generoso. Estes empregados do Patrão Chuva comunicam com os pajés pelo trovão. Este Patrão fornece diretamente ou indiretamente todos os bens para a vida terrestre. Porém os evangélicos vão para Casa de Deus (Bonilla 2005.47-48). Um alucinógeno, feito das folhas da vinha Bignomiaceae (Tanaeciuma nocturnum), é ainda inalado em duas formas pelos homens e é tomado na forma de um chá pelas mulheres. Estas práticas recuaram em algumas aldeias devido à influência evangélica (Schröder 2002). Hoje há uma igreja evangélica paumari. Os mortos evangélicos vão para Casa de Deus (Bonilla 2005.47-48).

Cosmovisão: A festa ihinika é dos espíritos dos alimentos, e os espíritos são chamados pelos pajés. Os espíritos também se organizam em relações de patrão e empregados, os espíritos empregados chegam às festas primeiro para anunciar a chegada do seu patrão espírito. Diversos animais representam os patrões e os empregados espíritos, por exemplo o patrão peixe-boi é assistido pelo boto tucuxi como seu timoneiro, o carrapato é empregado da anta espírita (Bonilla 2005.47).

Os animais são considerados de ter uma vida social semelhante aos Paumari, e esta possui qualidades semelhante à humanidade social, e são consideradas características paumari. Eles podem ser visto na mata com aparência humana que é chamada pamoarihi, semelhante aos pamoari (Bonilla 2005.50). Quando o caçador ou pescador mata um animal ou peixe ele leva para casa apenas uma ‘esteira’ (jorai) que o animal lhe entrega; os paumari não acreditam que comem a alma corpo (abonoi). A morte da caça é considerada como um tipo de troca pelas armas usadas. Os espíritos dos animais caçados dão artigos culturais ou mercadoria ao povo.

Comentário: A enfermeira Shirley Chapman da Sociedade Internacional de Linguística (SIL) chegou na aldeia na margem do Lago Maraha em 1964, e deu assistência médica por 32 anos, acompanhado por Mary Ann Odmark e depois em 1964 veio Meine Salza (ambas da SIL). Logo começaram a analise da língua e produziram um dicionário (Gee 2012.87). Um curso de alfabetização foi dado em duas aldeias, porém os Paumari pediu aulas em português (Gee 2012.162; Bonilla 2005). Em 1989, Rodolfo e Beatrice Senn, que mais tarde trabalharia entre os Nadëb, chegaram para libertar Chapman e Salza concentrar na tradução do Novo Testamento que foi dedicado em 24 de abril de 1996 (Gee 2012.182,196).

O ministério da Missão contribuiu a restaurar o auto estimo dos Paumari por uma estrategia de assistência médica, cursos de alfabetismo e a tradução do Novo Testamento. As missionárias trataram a doença pinta, tuberculose e treinaram alguns Paumari para fazer tratamentos básicos. Quando os Paumari viram sua língua escrita pelas obreiras, reconheceram que sua língua tem valor igual ao português, e quiseram aprender ler. Também quiseram aprender a aritmética para que os comerciantes não os trapaceassem mais. Hoje em dia as matérias de leitura são produzidas pelos próprios Paumari. O auto estimo dos Paumari aumentou quando começaram ler as Escrituras de um Deus que os ama como gente e não os trata de animal, e criou sua língua. A embriaguez diminui e foi eliminada entre os Evangélicos (Cahill 2004). Casais assistiram cursos bíblicos em Porto Velho. Rogério Rose de Silva (SIL) continua com a tradução do Velho Testamento (Gee 2012.208).

O conceito de um relacionamento de dependência, dívida e provisão de bens necessários é vital para os Paumari. Para comunicar o propósito de Deus é possível usar o conceito do homem como a imagem de Deus para com a criação, governando o meio ambiente e sempre em relacionamento de dependência da graça e de serviço com obediência ao Criador ‘Patrão’. ‘Dominar’ deve ser traduzido ‘governar’ conforme as instruções do Criador (Gen 3:1-6). Um animal, a serpente demonstrou rebelião desde o princípio, indicando a necessidade do papel de domínio da humanidade. A mulher deve ter a ‘amansada’ a criatura com a firmeza de obediência ao Criador. Este Patrão é sempre generoso e compassivo e se demonstrou no Filho e sua tarefa de obediência à cruz. Assim todas as dívidas pecaminosas estão canceladas, o relacionamento é reconciliado e o homem é transformado para cumprir seu papel de imagem pela graça. O conceito bíblico de alianças ensina o conceito de dependência e responsabilidade. As promessas e as alianças são cumpridos em Cristo e união com Cristo pela fé estabelece um relacionamento de aceitação, segurança e serviço no reino de Cristão.

Bibliografia:

  • BONILLA, Oiara, 2005, ‘O Bom Patrão e o Inimigo Voraz: Predação e Comércio na Cosmologia Paumari’, Mana 1 (1) pag. 41-66, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), RJ.
  • BONILLA, Oiara, 2011, ‘Paumari’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo, SP, Brasil. pib.socioambiental.org/pt/povo/paumari.
  • CAHILL, Michael, 2004. From endangered to less endangered: case histories from Brazil and Papua New Guinea.SIL Electronic Working Papers 2004-004. S.l.: s.n. n.p. www.sil.org/silewp/abstract.asp?ref=2004-004.
  • DAI/AMTB 2010, ‘Relatório 2010-Etnia Indígenas do Brasil’, Organizador: Ronaldo Lidório, Instituto Antropos –instituto.antropos.com.br.
  • GEE, Margaret, 2012, Called to Go, Lowestoft, Inglaterra: Lastword publications.
  • HEMMING, John, 1987, Amazon Frontier-The Defeat of the Brazilian Indians, London: Pan Macmillan.
  • SCHRÖDER, Peter, 2002, ‘Paumari’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo, SP, Brasil. pib.socioambiental.org/pt/povo/paumari./
  • SIL : 2009. Ethnologue: Languages of the World, Lewis, M. Paul (ed.), Sixteenth edition. Dallas, Tex.: SIL International, www.ethnologue.com.