David J. Phillips
Autodenominação: Terena.
Outros Nomes: Tereno, Eteiena, Txane.
População: 19.961 (DAI/AMTB); 24.776 (FUNASA 2009).
Localização: Vivem em 16 Terras Indígenas:
Terra Indígena Água Limpa (MS): 69;
T. I. Limão Verde (Aquidauana MS): 1.335;
T. I. Taunay/Ipegue (Aquidauana MS): 4.090;
T. I. Aldeinha (Anastácio MS): 356;
T. I. Araribá (Avai SP): 527;
T. I. Buritizinho (Sidrolândia MS): 668;
R. I. Dourados (Dourado MS): 11.800;
T. I. Icatu (Braúna SP): 155;
T. I. Kadiwéu (Corumbá e Porto Murtinho MS):1.629;
T. I. Lalima (Miranda MS): 1.374;
T. I. Nioaque (MS): 1.429;
T. I. Pilade Rebuá (Miranda MS): 2.104;
T. I. Umutina (Barra do Bugres MT): 367;
R. I. Nossa Senhora de Fátima (Miranda MS): população não indicada;
T. I. Terena Gleba Iriri (Matupá MT): 680;
T. I. Cachoeirinha (Aquidauana e Miranda MS): 4.920;
T. I. Buriti (Dois Irmãos do Buriti e Sidrolândia MS): 2.543.
Os Terena são possuidores de doze pequenas reservas de terra, que somam um total de 19.017 hectares, onde reside uma população aldeada de 13.643 pessoas. Conforme um censo realizado pela prefeitura de Campo Grande há na periferia de Campo Grande 820 famílias de índios não aldeados em1999.
Língua: Terena: Uma das 59 línguas Aruak (Arawak): Maipuran sulista- do grupo boliviano-paraná. Falado por 15.000, alfabetos 20%, alfabetos em português 80% Existem dicionário e gramática. O Novo Testamento foi publicado em 1994 (SIL). A última pessoa para falar a língua Guaná morreu em 2006, mas alguns jovens têm interesse em reviver a língua. O uso da língua Terena vareia entre as Terras Indígenas e a maioria tem orgulho em dominar o contato com a sociedade nacional, que favorece o uso do português.
História: O Chaco Boreal forma a maior parte do território do Paraguai e estende até o Pantanal no Mato Grosso do Sul, e forma uma região do Gran Chaco de mais de 600.000 km. quadrados. Mais de vinte povos indígenas viviam na área. Entre eles eram os Guaná, um povo agricultor e mais pacífico do que seus vizinhos, os Guaikurú. As suas aldeias eram grandes de 30 a 40 casas, cada casa com 20 a 30 pessoas, as famílias de irmãos e a população era acerca de mil. A aldeia estava situada no meio de um território extenso de roças. A sociedade era estratificada em classes, ‘nobres’, ‘guerreiros’ e ‘alheos’ (cativos e escravos) (Ladeira e Azanha 2004). Os Guaná gostavam de música. Sua população cresceu mais do que os outros.
Os Guaikurú eram nômades e ganharam cavalos dos espanhóis e guerrearam contra todos. Desceram nas aldeias dos Guaná e os tratavam como escravos, pois não gostavam de trabalho manual. Depois muitos ataques contra os portugueses e espanhóis, os Guaikurú, acompanhados de escravos Guaná, iniciaram a paz em 1791 com os portugueses, mas temeram a vingança dos espanhóis. Por isso 400 Guaikurú e 600 Guaná viajavam para o norte e pediram o governador do Mato Grosso que pudessem ficar nas terras entre Cuiabá e Albuquerque (Hemming 1995.120-123). Uma nova fortaleza portuguesa no rio Miranda protegeu estes índios de uma ataque dos espanhóis. Um grupo de Guaná formaram parte de uma expedição com os Bororo em 1829 (Hemming 1995.199).
Quando chegaram no Mato Grosso ainda eram guerreiros, atacando outros povos para ganharem escravos. No médio do século XIX, os Guaimuré no Mato Grosso dividiram, alguns continuaram ser nômades, levando todos seus pertences nos cavalhos e atacando os indígenas no outro lado do rio Paraguai. Os outros formaram os Kadiwéu. Os Guaná formaram os Kinikinao e os Terena (Hemming 1995.420). Eram um povo trabalhador com boas relações com os colonos, cultivando plantações de milho, mandioca, cana, algodão, aipo e tabaco. As suas mulheres fabricaram cobertores e redes de algodão. Os homens fizeram cintos, selas e também pescaram. Estabeleceram um comercio vendendo estes produtos nas cidades, inclusive Cuiabá. Todos aprenderam falar português e professaram o catolicismo,sob a influencia da missão dos Capuchinhos. A aldeia Terena tinha 110 casas e uma população de 2.000 e com mais 1.000 em outros assentimentos (Hemming 1995.421).
Os indígenas sofreram durante a Guerra do Paraguai, primeiro pela invasão do Mato Grosso pelos paraguaianos em 1864, que os espalharam e depois da guerra em 1870 quando a colonização de brasileiros aumentou dos vales dos rios Miranda e Aquidauana. O resultado era que os Terena perderam suas terras e caíram na escravidão de dívida quando trabalharam nas novas fazendas estabelecidas nos vales. A policia da nova República apoiou os patrões neste sistema. Os Terena chamam a época ‘o tempo de servidão’. Em 1903 chegou o então Tenente Cândido Rondon; ele, indignado pela situação dos Terena, reorganizou as aldeias de Bananal e Ipegue e suas terras contra as invasões dos fazendeiros. Ele deu garantias para os índios voltassem para as suas aldeias e viver conforme suas tradições. Esta proteção por Rondon contribuiu para a sobrevivência do povo Terena (Hemming 1995.426).
Durante a Segunda Guerra Mundial os Estados Unidos, com falso optimismo, encararam a Amazônia como uma fonte alternativa de recursos para substituir as outras negadas pelas hostilidades. Em 1941 um inventário dado ao governo norte-americano exagerou dos recursos. Porém um relatório feito pelos americanos falou da decadência da região e respondeu que os brancos precisam de ser civilizados primeiro antes dos índios, dos vícios de embriaguez e promiscuidade (Hemming 2003.261). Mas em 1953, Nelson Rockefeller comprou 50% de uma fazenda no território dos Kadiwéu e Terena no sul do Mato Grosso e não na Amazônia. Era coincidência que Dale Kietzman da SIL começou o estudo da língua Terena em 1956, pelo convite de Darcy Ribeiro, e também fundar um departimento linguístico da Universidade de Brasília. Os dois teriam muita influencia sobre o futuro da Amazônia e dos índios (Hemming 2003.261).
Na década 60 os Kadiwéu receberam o auxilio de missionários protestantes na educação e atendimento de saúde, mas os Terena prosperam e ficaram mais aculturados. A aldeia Bananal foi alcançada primeiro pelos missionários evangélicos da Igreja da Escócia Livre em 1913, e eles protestaram contra as invasões dos fazendeiros, apoiado pelo SPI em 1933 (Veja em baixo). Ribeiro e Kietzman observaram que a mensagem da minoria protestante atraiu os índios porque o Catolicismo era identificado com todas as maldades do contato com a maioria dos brasileiros (Hemming 2003.446). As terras reservadas para os Terena eram pequenas mas suficiente para cada família cultivar sua roça e criar dez ou cinze cabeças de gado, enquanto o território dos Kadiwéu foi reduzido a uma fração de uma terra maior, pela exploração dos fazendeiros e 10.000 posseiros, apoiados pelos funcionários da FUNAI. Só nos anos 80 a FUNAI começou a corrigir a situação, provocado por uma incitativa armada da parte dos índios (Hemming 2003.447).
Estilo da Vida: O terreno era dividido em lotes de 45m por 45 m. para um homem construir sua casa e cultivar um jardim. Outras parcelas podem ser cultivadas fora da aldeia. Os missionários ensinaram os indígenas usar roupa dos brancos, usar ferramenta moderna e falar e ler português. O SPI ensinou a construção de casas regionais, cultivar arroz, etc. e aprender outros ofícios como pedreiro, ferreiro, e a costeira. Muitos Terena trabalharam nas plantações de cana com contratos de 70 a 90 dias ou na estrada de ferro ou comerciar seus produto como farinha de mandioca, cana e redes de algodão. Outros são ‘contratados’ trabalhar nas usinas de açúcar e álcool, um processo chamado na região ‘changa’. Estes trabalhadores estão organizados em turma sob um ‘cabeçante’, que resulta em abuso de poder.
Mas a horticultura continua a ser a base da economia, com plantios de mandioca, feijão, milho, cana, arroz, bananas, laranjas, abóbora, melancia, batata-doce e maxixe. A criação de gado e cavalos é importante, e os Terena trabalham nas fazendas como peões. Os Terena plantam porque está no sangue, mas as roças são pequenas e a renda não dar par sustentar as famílias mas em cada família existe uma pessoas que recebe uma aposentaria. Alguns ainda caçam, pescam e coletam da terras nos cerrados e floresta ciliar. Nos anos 50 indivíduos Terena passaram a viver nas cidades e hoje uns 2.000 moram em Campo Grande e um número menor em Aquidauana e Dourados (Ladeira e Azanha 2008). Muitos procuram trabalho nas cidades, ou produzam cerâmicas para o comercio.
Sociedade: Os Terena chamam suas aldeias ‘setores’ e são autônimas, cada uma tem um cacique ou um conselho. A eleição dos caciques locais é administrada pelo cacique geral em T. I. Cachoeirinha ao lado do Posto da FUNAI. Assuntos que influenciam todos os setores são debatidos em uma reunião em Cachoeirinha. Nesta Reserva 27% vivem da renda de serviço fora da reserva e mais 55% trabalham fora quando há oportunidade (Ladeira e Azanha 2004). No chaco as aldeias eram dividas por metades, os ‘mansos’ e os ‘bravos’, cada tendo sua chefe. Nas cerimonias os ‘bravos’ fez brincadeiras nos ‘mansos’. Quando eles mudaram para o Brasil, o SPI escolheu apenas um chefe ou capitão para cada aldeia, que contrariou a organização antiga de metades, e o sistema de parentela perdeu sua importância e os termos portugueses para os parentes são usados (Oberg 2009).
A maioria das casas abrigam famílias estendidas, pai e mai com seus filhos casados e solteiros. O costume de residencia é patrilocal. Mas depois o novo casal tem filhos ele podem construir sua própria casa perto da casa do pai do marido. Entretanto há muitos casos de casais uxorilocais e a sociedade não exige dote ou outros requerimentos do marido. As divisões religiosas têm modificado este sistema.
Artesanato:
Religião: Os koixomunetí (pajés ou curadeiros) agem para curar de doenças causadas por espírito ou feitiço, auxiliados por ‘espíritos companheiros’. A sua maior festa (oheokotí) é quando a constelação das plêiades aparece no horizonte. Todos os pajés enfeitados sacudindo seu maracás passam a noite cantando para invocar seus espíritos companheiros dar boas colheitas (Ladeira e Azanha 2004). Porém muitos Terena são evangélicos.
Cosmovisão: O ser herói Yurikuvakái tirou os antepassados dos Terena de baixo da terra e os ensinou o uso do fogo e das ferramentas agrícolas. Considerados assimilados ainda os Terena dão valor à identidade ética.
Comentário: Missionários Harry e Sra. Whittington com e missionário Hay, da Igreja da Escócia Livre, trabalhando entre os índios no Paraguai, viajaram a cavalo e tiveram o primeiro contato com os indígenas em Niosac, Mato Grosso, 21 de agosto 1912. Aqui um Capitão dos Terena os convidaram visitar sua aldeia. Depois viajaram cinco dias para a aldeia principal de Bananal e Ipegue com uma população 450. Os visitantes foram bem recebidos e foram convidados também às aldeias Caxueirinha e Pasuerinha. Os líderes convidaram que os obreiros voltassem para estabelecer escolas nas aldeias (Whittington 1965.116ss). Voltaram a remo de Miranda MT nos rios para Paraguai!
Respondendo ao convite, o casal Whittington com um casal Howard, novato no campo, voltaram para Brasil em 1913, porém os indígenas não permitiram os missionários enter em Bananal sem autorização do SPI, que foi recebida depois uma demora de um mês enquanto os obreiros acamparam ao ar livre em baixo de coberturas. Começaram uma escola e cultos com uma boa assistência, mas os Terena recusaram cumprir uma promessa de construir uma sala de aula, porque suspeitaram que os brancos queriam tomar conta das terras e expelir os índios. O governo prometeu um professor, que não veio (Whittington 1965.138). Os missionários mudaram uns 15 km. fora de Bananal, fecharam a escola, mas fizeram visitas para dirigir os cultos e o povo demonstrou interesse e ânimo para aprender cantar e houve os primeiros conversos.
Entretanto, quando o professor enviado pelo SPI chegou, influenciou os índios contra a ‘heresia’ protestante, mas ao mesmo tempo ofereceu a nova sala de aula para os cultos, e depois convidou um padre para aumentar a oposição que dividiu a comunidade (Whittington 1965.145)! Ele pediu um pajé enviar um espírito para matar os missionários e depois preditou que Deus ia matá-los. Dias depois os Whittington foram atingidos por um raio, sem sofrer injúria permanente, mas os crentes. Os índios perturbados por este acontecimento eram mais convencidos do evangelho. Apesar da oposição o primeiro culto de batismo foi realizado em 31 de dezembro 1915 com quatro batizandos e ‘a primeira igreja indígena no Brasil’ foi fundada dias depois entre os Terena (Whittington 1965.148).
Em 1920 os missionários foram presos na sua própria casa pelo SPI. Uma visita à sede do SPI no Rio de Janeiro era necessário para continuar o trabalho (Whittington 1965.163ss). Após estas dificuldades o trabalho recomeçou com a escola durante o dia e o instituto bíblico para evangelistas Terenas à noite. Os missionários observaram que os evangélicos brasileiros da época não levaram o evangelho aos índios, então resolveram treinar os índios para alcançar seu próprio povo.
O fruto deste trabalho pioneiro hoje é a Missão Indígena Uniedas (União das Igrejas Evangélicas da América do Sul), que serve com missionários e Escola Evangélica Lourenço Buchman funda em 1954. Também o Instituto Bíblica Cades Bárnea, fundado em 1988 com alunos Terena e Xavante, oferece um curso de missões de três anos. A União é composta de 33 igrejas entre os Terena, Kadwéu, Xavante e 3 em Rondônia. A Igreja de Bananal tem 136 membros e a de Ipegue 18.
Muriel Ekdahl, Nacy Butler e Muriel Perkins do SIL traduziram o Novo Testamento durante 35 anos. Para aproveitar a oralidade do povo, filmes e outra média estão sendo usado para promover o uso da tradução. Um rádio terena transmite programas usando a tradução. Dois obreiros terena, Ladislau Faris e Cenisio Custodio estão traduzindo livros do Velho Testamento (SIL).
Também alunos terena foram treinados no Instituto Filipe Landes e no Centro de Treinamento Ami. Global Recordings produziu um áudio de histórias bíblicas e o filme Jesus é em Terena.
Um mini COMPLEI foi realizado entre os Terena em 2010; Pr Henrique Terena é presidente do COMPLEI.
Bibliografia:
- DAI/AMTB 2010, ‘Relatório 2010 – Etnias Indígenas do Brasil’, Organizador: Ronaldo Lidório, Instituto Antropos –instituto.antropos.com.br.
- HEMMING, John, 1995, Amazon Frontier-The Defeat of the Brazilian Indians, London: Pan Macmillan.
- HEMMING, John, 2003, Die If You Must – Brazilian Indians in the Twentieth Century, London; Pan Macmillan.
- LADEIRA, Maria Elisa e AZANA, Gilberto, 2004, ‘Terena’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo. pib.socioambiental.org/pt/povo/terena.
- MNTB 2005, Missão Novas Tribos do Brasil, Anápolis, GO, www.mntb.org.br.
- OBERG, Kalervo, 2009, ‘Terna Social Organization and Law’, American Anthropologist, Vol. 50, Issue 2, On line 28 Oct 2009.
- SIL 2009, Lewis, M. Paul (ed), Ethnologue: Languages of the World, Sixteenth Edition. Dallas, Tex: SIL International. Versão on line: www.ethnologue.com.
- WHITTINGTON, Harry, 1965: On the Indian Trail in Paraguay and Brazil, Edinburgh: Knox Press.