Guarani Nhandeva – Avá

David J Phillips

Autodenominação: Avá que significa ‘pessoa’ (ISA 2011), Nhandeva (Almeida2003)

Outros Nomes: Pai Tavyterã, Ava-Chiripá, Nhandeva, Chiripá (DAI/AMTB 2010). Há três grupos de Guarani que vivem no Brasil: 1. Mbya, 2. Kaiowá ou Pãi-Tavyterã. 3. Ñandeva ou Avá Guarani (ISA 2011). Outros nomes são Chiripá, Kainguá, Monteses, Baticola, Apyteré, Tembekuá e outros.

População: No Brasil: 5.000 (DAI-AMTB 2010), 6.000 (ISA 2003). População total 25.450.

  • Na Argentina: 3.000 (SIL).
  • No Paraguai: 16.400 (SIL).

Guarani total: 46.000, a etnia mais numerosa no Brasil e vivem em sete Estados, com outros na Argentina, na Bolívia e no Paraguai (Survival 2013).

Localização: Vivem em 48 Terras Indígenas no Brasil. No Paraguai são chamados Pai Tavyterã, nos Departamentos de Caaguazú, Guairá, Caazapá, San Pedro, Concepción e Canindeyú.

Lingua:
Guarani. Vocabulário semelhante 75% com Guarani paraguaiano. Família linguística: Tupi-Gaurani, subgrupo I. Alfabetismo 10%-30% e na segunda língua 15%-25%. Guarani Mbyá, Da família Tupi, Tupi-Guarani, Sub-grupo 1.

Dialetos: Tambéopé, Baticola. Compatidade Lexical 75% como Guarani Paraguaiano. Alfabetismo 10-30% e em português 15-25% (SIL). Tradução da Bíblia completa em 2004. É uma das línguas oficiais do MERCOSUR. Guaraní tornou-se língua oficial com português no município de Tacuru MS.

No Paraguai é uma das línguas oficiais com Espanhol e a metade da população rural são monolíngues. Um vocabulário especial, ayvu porã, é usado nos rituais. In 2010, Guarani tornou-se língua oficial com Português no Município de Tacuru, MS. No Brasil, Guarani Paraguaiano é chamado Guarani Kaiowá.

Na Argentina é a segunda língua oficial na Província de Corrientes desde 2003.

Uma versão de Guarani, Chiripá, é falada no Brasil e chamada Nhandeva.

História:
Em 1526 Sebastião Caboto explorou o Rio del la Plata para descobrir a demarcação do Tratado de Tordesilhas e subiu o rio Paraná e montou uma fortaleza chamada Espirito Santo. Voltando em 1529 ele descobriu que índios tinham destruído a fortaleza.A expansão do Brasil colonial para o sul até o rio da Prata era impedida pelas missões jesuítas espanhóis, os que eram aceitas pelos Guarani do Paraguai e por isso os padres se estenderam na área do atual Rio Grande do Sul. Os missionários administrariam trinta Missões com mais de cem mil indígenas. As Missões eram vilas com os índios morando em casas em redor de uma praça rectangular, com escola, igreja, mas a cultura guarani era destruída (Hemming 1987.105s). Os Jesuítas em contraste com outras missões tentaram integrar os benefícios da civilização cristã com vários dos valores culturais dos próprios índios, respeitando suas tradições.

No princípio somente os bandeirantes paulistas oporiam as Missões com o motivo de escravizar os índios. Porém o tratado de Madri em 1750 decidiu a fronteira entre a Espanha e o Portugal no rio Uruguaio, com a consequência de deixar sete missões de Guarani, os Sete Povos das Missões, sob a jurisdição portuguesa que eles não aceitaram. Dois anos de guerra entre os portugueses e os espanhóis foram necessários para os dominar em 1756. 1.400 Guarani perderam suas vidas na batalha de Caibaté. Os jesuítas foram expulsos em 1759. As terras das Missões eram exploradas, os índios escravizados, pelo avanço de criadores de gado com vastas manadas de milhares (Hemming 1987.104). Os Sete Povos passaram sob o domínio espanhol entre 1777-1801 quando eram capturados de novo pelos portugueses. Mas a situação dos próprios Guarani passou de mal para pior, explorados pelos soldados. Os índios espalharam e seu gado e cavalos foram perdidos. A independência do Paraguai provocou guerra constante e em 1821 a população indígena foi calculada ser apenas 3.000 (Hemming 1987.151).

Cedo no século XX o SPI criou oito ‘reservas’ para os Kaiowá e Nandeva nos estados de Mato Grosso do Sul, Paraná e São Paulo. Os antigos aldeamentos do século XVI se transformaram em Postos Indígenas para ensinar os indígenas trabalhar, sob controle dos funcionários do SPI. Estas Reservas eram pequenas e serviram para desapropriar as terras indígenas pelas empresas agropecuárias. Os fazendeiros usaram a mão de obra dos Guarani para estabelecer as fazendas e depois foram expulsos pela força (Almeida 2003).

No Mato Grosso do Sul, não obstante a prática de constrição em Reservas estabelecidas pelo Estado, inúmeros grupos macros familiares escolheram permanecerem nas áreas de florestas – não raro nos fundos de fazendas que toleram sua presença. O desmatamento dos anos 1970 levou os indígenas fora das reservas, considerados pela FUNAI como “desaldeados”, a se deslocarem continuamente, fugindo de áreas ecologicamente destruídas e da hostilidade do branco. Em 1980, já com matas miúdas onde pudessem manter-se isolados, porém não foi mais possível evitar conflitos frontais com os brancos que os queriam expulsar para as áreas de Postos Indígenas. A situação levou Ñandeva e Kaiowa a se organizarem e reivindicar os territórios perdidos.

Isso tudo teria levado os Guarani do Mato Grosso do Sul a uma reflexão inexorável sobre as condições territoriais e se empenharem em elaborar culturalmente as condições do presente no sentido de construir relações com o passado através da organização da memória dos vários grupos macro famílias e da percepção dos espaços por estes ocupados no correr do tempo, reforçando o próprio sentimento de autoctonia. Nas últimas décadas os Guarani do Mato Grosso do Sul levantaram reivindicações territoriais no tocante à vinculação direta entre as famílias extensas e territórios específicos, isso é os tekoha do grupo social no seu ambiente natural determinado, que por sua vez forma uma rede intercomunitária com os outros Guarani. Desde 1977 têm esforçado recuperar terras compulsoriamente abandonadas no passado, e até 2003 dezesseis tekoha foram recuperados (Almeida 2003).

Os Guarani vivem em pequeno pedaços de terra, ‘ilhas’ cercadas por fazendas de cana ou gado. Não há espaço para realizar a vida do tekoha, caçar, pescar. Para este povos que sempre procurava a ‘Terra sem Mal’ as restrições da situação territorial é uma pressão psicológica que leva a conclusão que não vale a pena viver. Especialmente os jovens até as crianças de baixo de 14 anos suicidaram-se. Entre 1985 e 1999 mais de 300 Gurani se mataram (Watson 2000.63).Em 2013 em Mato Grosso do Sul dois lídres Guarani foram mortos: Celso Rodrigues próximo à T. I. Paraguacu. Ambrosio Vilhalba que lutou pelos direitos do povo contra os fazendeiro foi morto em Guyra Roka.

Estilo da Vida:
O território atual dos Ñandeva compreende os rios Jejui Guasu, Corrientes e Acaray, na Província de Concepción, no Paraguai, e, no Brasil, o Rio Iguatemi e seus afluentes, sendo encontrados também nas proximidades da junção deste com o Paraná. Têm sua limite norte na margem esquerda do Rio Iguatemi nos estados do Paraná e Mato Grosso do Sul. Ao sul têm como vizinhos os Guarani Mbya e ao norte os Guarani Kaiowá. No começo do século XX migrações estabeleceram os assentimentos nos estados de São Paulo, Santa Caterina, Paraná e Rio Grande do Sul. Há no Brasil perto de 85 áreas guarani oficialmente reconhecidas (Almeida 2003).

Os ava vivem em comunidades chamados de tekoha, constituídas por três até cinco famílias extensas, que deve ter terra suficiente para roçados, recursos de água, e matas como animais para caçar, peixe para pescar, matéria-prima para construir as casa e artefatos, e planta e frutos para a coleta. Isso é uma unidade territorial para sustentar o teko, o modo de viver dos Guarani (Almeida 2003).

Sociedade: Os Guarani se organizam em tekoha, eles caminham entre estes fazendo ora visitas ou mudanças de famílias ora realizar casamentos .A família extensa consiste de um casal, filhos, genros e netos de forma a unidade de produção e consumo, sobe a liderança de um homem chamado Tamõi (o avô). Cada tekoha é liderado por um cacique e capitão, porém seu poder é limitado pela autoridade dos Tamõi, lideres das família extensas.

O Tamõi determina aonde habitam as famílias nucleares, mantêm suas roças e usam os outros recursos naturais dentro o espaço que a sua família extensa ocupa na área do tekoha(Almeida 2003). Casamento é entre família extensas. As moças, na ocasião da primeira menstruação, têm seu cabelo cortado e mantêm dentro de suas casa, comem somente uma dieta especial. Casamento segue depois isso com um rapaz de 16 a 18 anos. Normalmente constroem uma casa ao lado dos pais da noiva. A poligamia é mais frequente entre os Nhandeva enquanto é proibido pelos Kaiowa (Almeida 2003).

Artesanato:

Religião: O ser mitológico Pa’i Kuara se considera a fonte d auxilio em momentos de penúria e doença. Há quatro ‘cuidadores das almas dos homens’ que cuidam das águas, dos animais e das roças. Os rituais são conduzidos pelos ñanderu, peritos religiosos, anoitecer com reza, danças e cânticos. Nas cerimônias os homens fazem música com os mbaraka, especie de chocalho feito de uma cabaça cheia de sementes específicas e as mulheres os acompanham com o takuapu, um taquara com um comprimento de 1,10m, que é goleado no chão. Amimby apyka, flauta sagrada, e o tabaco (petÿ) são usados.

Cosmovisão: Pelos séculos os Guarani têm sonhado e procurado ‘uma terra sem mal’, livre de dor e sofrimento, e mudariam de lugar constantemente na busca da ‘terra de imortalidade e descano perpetuo’ (Survival 2013). Hoje os Guarani denominam suas comunidades com o território físico e seu recursos de Tekoha. Este conceito inclui os relacionamentos sociais, o modo de viver guarani (teko), e o meio ambiente em redor, o ka’aguy, que é a base do seu cosmovisão. Estes lugares como mato e seu aspectos topográficos são associados com os ancestrais das famílias extensas que os habitam, a origem antiga (ymaguare). O ka’aguy é a base da construção da sua cosmologia e a mitologia. A ligação entre a unidade social Guarani e seu território específico é essencial para o viver Guarani e manter o equilíbrio cósmico (Almeida 2003).

Ñane Ramõi Jusu Papa, Nosso Grande Avô Eterno, conforme a mitologia, criou o mundo de uma substância originária vital chamada jasuka. Criou a terra como uma rodela, o céu e os rios e o mato. Criou também sua esposa, Ñande Jari, Nossa Avó e outros seres. Brigou com a esposa, ficou com raiva e quase chegou a destruir sua criação. Mas Ñande Jari entoou o primeiro canto sagrado, acompanhado pelo takuapu, que é um taquara de 1,10 m, que é golpeado no solo. Assim a criação foi salva.

Ñande Ru Paven, Nosso Pai de Todos, o filho de Ñane Ramõi e sua esposa Ñande Sy, Nossa Mãe, distribuíram a terra entre os povos, e deram o fogo, a flauta sagrada e o tabaco aos homens. Sua esposa deu a luz gêmeos que cuidavam do sol e a lua, mas Ñande Ru Paven abandonou a terra. Ñande Sy viajou a procura do marido e chegou a terra das onças, que a mataram. Mais tarde os gêmeos tentaram vingar a morte da mãe e mataram todas, a não ser uma, e por esta razão ainda existem onças no mundo.

Pa’i Kuara e Jasy viveram diversas aventuras sobre a terra e depois resolveram encontrar ao seu pai, e subiram por construir uma escada de flechas.

Comentário: Missões protestantes têm atuado entre os Guarani desde 1928.NTMB trabalha com este povo

Bibliografia:

  • ALMEIDA, Rubem Ferreira Thomaz de, 2003, ‘Guarani Kaiowá’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo. pib.socioambiental.org/pt/povo/guarani-kaiowa
  • ISA, equipe, 2011, ‘Guarani’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo. pib.socioambiental.org/pt/povo/guarani
  • DAI/AMTB 2010, ‘Relatório 2010 – Etnias Indígenas do Brasil’, Organizador: Ronaldo Lidório, Instituto Antropos –instituto.antropos.com.br
  • HEMMING, John, 1987, Amazon Frontier-The Defeat of the Brazilian Indians, London: Pan Macmillan.
  • HEMMING, John, 2003, Die If You Must – Brazilian Indians in the Twentieth Century, London; Pan Macmillan.
  • SIL 2009, Lewis, M Paul (ed), Ethnologue: Languages of the World, 16th Edition. Dallas, Texas: SIL International. Versão on line: www.ethnologue.com
  • SURVIVAL 2013, ‘The Guarani’, Survival for tribal peoples, www.survivalinternational.org/tribes/guarani acessado Outubro 2013.
  • WATSON, Fiona et all, 2000, Disinheirted: Indians in Brazil, London: Survival International.