Tuparí

David J. Phillips

Autodenominação: Tupari

Outros Nomes:

População: 433 (DAI/AMTB 2010), 517 (FUNASA 2010), 380 (SIL).

Localização: Em duas Terras Indígenas:

T. I. Rio Branco: Homologada e registrada de 236.137 ha de floresta ombrófila aberta, entre os Rios Branco e São Simão, afluentes do Guaporé, com 679 indígenas (FUNAI 2008) Tuparí com Arikapú, Aikanã, Aruá, Djeoromitxi, Kanoê e Makurap. 329 Tupari (ONG Kanindé 2005). 382 em 13 aldeias (Cruz 2005).

T. I. Rio Guaporé: Homologada e registrada de 115.788 ha de floresta ombrófila aberta, na margem direita do Rio Guaporé, fronteira com a Bolívia e extenso até o Rio Sotério, próxima à cidade de Guajará Mirim com 589 indígenas (FUNAI 2005), Tuparí com Arikapú, Aikanã, Aruá, Djeoromitxí, Kanoê, Kujubim, Makurap, Sakurabiat, Wajuru e Wari’. 49 Tuparí (FUNAI 2005).

Língua: Tuparí e português. 180 falantes de Tuparí na década 90 (Mindlin 2002.300). Da família linguística Tupi – Tuparí. Usada como segunda língua pelos Aricapu (SIL).

História: Os indígenas do Rio Branco tiveram contato com os brancos no princípio do século XX quando os Tuparí, Makuráp, Wayoró, Aruá e Jabuti foram atraídos pela frente de borracha para ganhar os bens industriais, eram impressionados especialmente com os machados de aço. O cacique Vaitó contou ao etnográfico suiço Franz Caspar que os Makuráp trabalharam com os seringueiros primeiro e convidou os Tuparí para também ter contato, mas seus lídres consideram os brancos tarupa, espíritos maus que trazem a morte. Entretanto os Tuparí eram surpreendidos pelos machados e facas de aço, porém observaram os Makuráp com tosse e febres e morrendo. Afinal em 1927 dois vizinho trouxe um branco chamado Cravo à aldeia Tuparí. Mas Cravo estava gripado e logo alguns Tuparí ficaram doente e morreram. Em 1934 um alemão também visitou os Tuparí e logo depois muitos morreram de gripe. Nesta época os 3.000 Tuparí, mesmo temidos como guerreiros, eram em paz com seus vizinhos (Hemming 2003.59-60). Um seringalista Paulo Saldanha instalou-se nas cabeceiras do Rio Branco e os Arikapú e os Djeoromitxí abandonaram suas aldeias por 1934 para trabalhar no barracão dele (Voort 2008).

Os seringalistas amontaram um ‘barracão’ chamado São Luís perto da boca do Rio Branco para armazenar o látex e outros produtos da floresta como castanha do Pará, até as embarcações os levaram para Guajará-Mirim. Na época a língua Makurap era uma língua geral e os Arikapu eram confundidos com este povo. Os Arikapu e outros foram levados para limpar e cultivar as plantações de milho e mandioca. Mas como os primeiros que trabalharam de seringueiros, estes pegaram e muitos morreram de gripe, bronquite e outras doenças trazidas pelos brancos (Hemming 2003.59-60).

A consequência das ferramentas de aço era que os homens abriram roças maiores com mais fartura, terminando a dependência da caça e da pesca. Com mais tempo livre os jovens mudaram para o lado dos seringalistas, e adotaram a comida e roupa deles. Porém nas meadas da década 30 a situação mudou, quando o agente da SPI levou à força índios para a cidade de Guajará Mirim e para o local da futura Terra Indígena Guaporé em cima da confluência do Rio Mamoré e eram forçados de trabalhar em condições brutais e muitos fugiram (Voort 2008). Ele comprou muitos seringais e oprimiu os índios. Estabeleceu um reinado de terror com um Boliviano chamado Severino e seus capangas em São Luís. Um grupo de Makuráp rebelaram e mataram Severino e os capangas.

Durante a Segunda Guerra Mundial o governo organizou um ‘Exercito de borracha’ e os seringueiros novos criaram tensões com os indígenas por tomar as mulheres. Em 1952 um seringueiro trouxe sarampo e muitos índios morreram (Hemming 2003.60-63). O suíço Franz Caspar viajou pela região em 1948 e subiu o Rio Branco, achando malocas Tuparí, Jabuti e uma dos Aricapú (Melatti 2011)

Estilo da Vida: Os Tuparí viviam em malocas redondas com um esteio central em torno do qual estavam os potes grandes da chicha. Esta bebida é fermentada ou fresca, feita de milho ou inhame, pelas mulheres e tomada continuamente, porque eles evitam tomar água. É fermentada por um processo de mastigação pelas mulheres, de um bocado de milho, cará, mandioca ou inhame. As famílias alojaram na periferia à parede (Melatti 2011.2-3).

Hoje as aldeias Tuparí consistem de casas rectangulares, com telhados de palha e paredes de barro, substituindo as malocas até as meadas do século passado. São principalmente agricultores e cultivam nas suas roças o milho, a macaxeira, o inhame, o cará e de predileção, o amendoim. Os homens cuidam das suas próprias roças, mas também colaboram na roça do chefe da maloca. Como recompensa o chefe os convida para as festas que duram três dias. Os Tuparí gostam de caçar, mas animais maiores têm desaparecidos da região. Usam timbó para pescar. Consomem cobras e larvas de abelhas, grilos, besouros e outras insectos, torradas, assadas ou cruas misturadas ao mel (Melatti 2011.2-3).

Sociedade: As etnias dos Tuparí com os Aruá, Arikapu, Jabuti, Makurap e Sacurabiap partilham do chamado ‘complexo cultural do Marico’, conforme a analise da antropológica Denise Maldi Meireles (1953-96). Os caraterísticos são: Uma família extensa e patrilocal morando em uma maloca redonda, estrutura de domo sustento por um esteio central. Com a ausência da cultivação da mandioca ‘brava’, e pois a falta da farinha do mandioca, plantam o milho. O consumo da chicha de milho é parte da alimentação diária. Também bebem a chicha fermentada nas festa cerimoniais. As aldeias revezem em ser anfitriã e os convidados. Isso cria redes de solidariedade e reciprocidade. Este povos também confeccionam o marico (PIB 2003).

A iniciação da jovem é de ser em reclusão por alguns meses comendo só o alimento permitido pelo pajé. No final da reclusão têm que fazer jejum e só volta a comer quando as mulheres lhe arrancam os cabelos da cabeça (Melatti:2011.4). Os meninos, depois a colheita do amendoim, oferecem ramos de palmeiras aos homens adultos para que com eles os açoitam. Também os homens jogam com uma bola de borracha, golpeando a bola somente com as cabeças e não com os pés (Melatti 2011.5). Depois casamento a residencia é uxorilocal (PIB 2005).

Artesanato: A confecção do marico, que são cestas feitas de fibras de tucum ou buriti, tecidas pela mulheres em ponto miúdos e médios (PIB 2003).

Religião: No meados do século XX os pajés cuidavam dos doentes (Melatti2011.4). Eles usam um pó alucinógeno das sementes do rapé ou paricá (Anadenanthera peregrina) para comunicar com os espíritos em transe. Faziam oferenda de carne de macaco aos espíritos. Faziam magia para adiar a chuva que ameaçava parar a queimada. Os adultos que têm filhos e os pajés não devem comer cobras (Melatti 2011.3). Um rito curiosos dos Tuapri é a retirada do alento das pessoa ou coisas em despedidas ou vendas de artefatos (Melatti 2011.5).

Os espíritos dos mortos comparecem em uma cerimonia dirigida pelo pajé, na qual são oferecidos presentes e alimentos, que são comidos depois a retirada dos espíritos. Os espíritos constituem uma transformação das pupilas dos olhos da pessoa morta. Quando os mortos chegam na terra dos mortos o lidar da maloca dos mortos lhe pinga suco de pimenta nos olhos e dois vermes devoram as vísceras. Vivem cantando e dançando, se transformam em moços e não cultivam roças. Uma segunda alma sai do cadáver enterrado na maloca e fica na casa (Melatti 2011.5). Os mortos são chamados os Pabid e visitados pelos pajés.

Cosmovisão: Os mitos Tuparí atribuem a criação do mundo aos pajés maus primordiais, chamados Waledjád e Wab, que saíram de uma grande pedra e fabricaram duas mulheres para si mesmos de duas arvores. Outros pajés da terra e das águas nasceram e são chamados os Wamoa-pod. O Waledjád ficou zangado e causou um grande dilúvio e muitos dos Wamoa-pod morreram afogados. Os sobreviventes se vingaram de Waledjád e um ave grande o levou para o norte e ainda quando ele se zanga ainda causa a chuva na terra.

Outro mau pajé era Aunyain-á que comia os filhos dos vizinhos. Os vizinhos fugiram, subindo um cipó para céu. Aunyain-á começou a subir e um papagaio bicou o cipó que se partiu e Aunyain-á caiu e ficou estraçalhado. Dos membros dos seu corpo nasceram os animais. No céu viviam pajés com corpo de bico, como os macacos. Quando os pajés Tuparí cheiram tabaco e angico, o pó chama os pajés do céu para participar da cerimonias.

Os antepassados dos Tuparí moravam debaixo da terra em escuridão. Uma noite subiram por um buraco para a terra e acharam plantações de amendoim e milho. Comeram bastante e voltaram debaixo da terra. Os donos da plantações eram pajés e descobriram o buraco pela qual os antepassados saíram, e o tamparam com uma pedra. Mas os homens saíram de novo e os pajés deram lhes pés e dentes normais. Os homens dividiram em etnias (PIB 2005). Vale notar que a grande árvore, esteio do mundo, que em várias mitologias indígenas é produtora de milho, na mitologia Tuparí é a árvore do amendoim (Mindlin 1993: 48-57).

Outro mito Tuparí fala de uma mulher dormecida na rede com seu marido, cuja cabeça se separa do corpo para procurar e se saciar de alimento de outras malocas e aldeias. O marido não sabe porque seu peito estava ensanguentado quando acordava nem que a mulher fermenta a chicha por pingar sangue de um dos dedos dela. Mas os parentes do marido descobram o corpo da mulher sem cabeça e o jogam numa fogueira. A cabeça conseguiu se reunir com o corpo e a mulher vira bacurau (curiango – Nyctidromus albicollis) e sai voando. Então veio às noites seguintes como um espírito malévolo e chamava o marido para a seguir e sobem por um cipó até o céu e ele virava em uma estrela. Por isso se diz quando o bacurau canta à noite é sinal que alguém vai morrer (Mindlin 1996).

Conforme Mindlin muitos dos mitos falam da relação entre homem e mulher, e o seguinte é uma advertência contra a promiscuidade. Uma mulher estava gravida e comia apenas a cabeça dos piolhos. Quando o filho nasceu ele cresceu a ser um bom caçador e comeu apenas as cabeças das caças. Ele foi mandado embora pelo tio para morar na mata e encontrou com os Pawatü, que eram arvores que se transformaram em fantasmas antropoides. Ele cria mais ‘povo espíritos’ que voltou à aldeia buscar a mãe. Mas ela não saiu com o filho, porque sentiu saudade dos parentes. Então ele retornou à aldeia, matou diversos parentes e os transformou na forma fantasma. Os Pawatü usavam uma pasta feita de folhas para garantir que seus desejos sejam realizados. Os Pawatü sempre eram os inimigos dos Tuparí. O grupo foram no mato para caçar e encontrou com os Pawatü, que atacaram e mataram todos senão três que escaparam (Mindlin 2002.97-106).

Comentário:

Bibliografia:

  • CRUZ, Samuel, 2005, ‘Tupari’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo. pib.socioambiental.org/pt/povo/tupari.
  • DAI/AMTB 2010, ‘Relatório 2010 – Etnias Indígenas do Brasil’, Organizador: Ronaldo Lidório, Instituto Antropos –instituto.antropos.com.br.
  • HEMMING, John, 1987, Amazon Frontier-The Defeat of the Brazilian Indians, London: Pan Macmillan.
  • HEMMING, John, 2003, Die If You Must – Brazilian Indians in the Twentieth Century, London; Pan Macmillan.
  • MELATTI, Julio Cezar, 2011, Áreas Etnográfica da América Latina Cap 25–Mamoré-Guaporé, Brasília: DAN-ICS-UnB www.juliomelatti.pro.br/areas/25areas.htm. acessado 28 de agôsto 2013.
  • MINDLIN, Betty, 1996, Criação, ESTUDOS AVANÇADOS 10 (27), www.scielo.br/pdf/ea/v10n27/v10n27a15.pdf‎. acessado 28 de agosto 2013.
  • MINDLIN, Betty, 2002, Barbecued Husbands and other stories from the Amazon, London: Verso.
  • PIB, 2005, Equipe de edição da Enciclopédia, ‘Tupari’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo. pib.socioambiental.org/pt/povo/tupari.
  • SIL 2013, Lewis, M. Paul, Gary F. Simons, and Charles D. Fennig (eds.). 2013. Ethnologue: Languages of the World, Seventeenth edition. Dallas, Texas: SIL International. Online version: www.ethnologue.com.