Ajuru / Wajuru

David J Phillips

Autodenominação: Wajuru

Outros Nomes: Wayoró (DAI/AMTB 2010), Wayurú, Ayurú, Wajuru ou Ajuru (Pinto 2010).

População: 94 (DAI/AMTB 2010), 213 (FUNASA 2010).

Localização: Terra Indígena Rio Guaporé, Rondônia, 115.788 há homologadae registra no CRI e SPU. No rio Colorado e seu afluente Terebitona margem direta do baixo rio Guaporé com o rio Mamoré na TI Rio Guaporé (115.788 ha), no município Guajará Mirim, com grupos das etnias Makurap, Djeromitxi, Tupari, Arikapo, Aruá, Massacá (Aikanã), Canoé, Cujubime indivíduos dos Wari. Total na TI 600 (Pinto 2009.13).

Língua: Português (DAI/AMTB 2010). Wayoró (SIL) com população de 80, mas quase extinta. Esta (Wajuru) com Makurap e Tupari são línguas classificadas na família Tupari do tronco Tupi (Pinto 2009.18). Os mais velhos falam a língua na vida doméstica. Hoje existem apenas uns dez falantes da língua; os jovens falam o português (Pinto 2009.18).

História:
O rio Guaporé formava uma barreira natural entre as colônias espanhóis e portuguesas depois o Tratado de Madri em 1750, mas a região somente começou a ser ocupada pelos colonos na segunda metade do século XIX, com a demanda da borracha (Pinto 2009.24). O tempo entre a marcação da fronteira e o circulo da borracha é pouco conhecido e a história de sociedades inteiras é completamente desconhecida.

O antigo território dos Wajuru era o Igarapé Preto, nas cabeceiras do rio Terebito, afluente do Colorado. Existiam três subgrupos entre os Wajuru: Guayurí (‘povo da pedra’), Kündir iat (‘povo do mato’) e Wakünan iat (‘povo da cotia’), que tinham territórios diferentes mas falavam a mesma língua. Os Wajuru tinham a reputação de ser mais bravos do que os outros, até matar seus cunhados. Os Wajuru e Jaboti deixaram os cadáveres dos inimigos para os urubus comer, em contraste com os Tupari, que destinavam os inimigos aos ritos canibais. Faziam as pazes por visitar os outros nas festas de chicha. Nestas ocasiões eles dançavam, cantavam e faziam trocas de artesanatos, e às vezes trocaram mulheres. Eram nas chichadas que aconteciam os namoros e casamentos entre os povos, que eram marcados pelo uso da terminologia de consanguinidade entre os povos diferentes. A hospedabilidade era considerada um processo de ‘amansar’ os outros (Pinto 2009.43).

Os indígenas viviam isolados na áreas mais inacessíveis, até o século XX e a procura de borracha, e até novamente a nova demanda do látex durante a Segunda Guerra Mundial. Os povos que viviam nas cabeceiras dos afluentes do rio Guarporé, em ordem decrescente na margem direita, nos rios Mequéns, Colorado, São Simão, Branco e São Miguel, sofreram as consequências do contato com os seringalistas (Pinto 2009.24 citando Maldi 1991). Em 1914, o inglês P H Fawcett, encarregado do Governo Boliviano, encontrou com 2.000 ou mais ‘Maxubi’ no rio Colorado, que na realidade eram os Arikapo trabalhando no seringal (Pinto 2009.25).

Nos anos entre 1910 e 1920 mais dois seringais eram montados no alto rio Branco, quando o contato intensificou para os Wajuru, Makurap e mais tarde os Jaboti e Aruá. Os seringalistas incorporaram os índios no trabalho pelo sistema de escravidão de dívida. Alguns dos seringueiros nordestinos se casaram com as indígenas, inclusive com mulheres Wajuru. Os Kündir iat aprenderam ‘amansar’ os brancos mais cedo que os outros, porém os Jaboti queriam fazer guerra contra os brancos, porque não os aceitavam ser humanos (Pinto 2009.47). Os brancos que aprenderam a língua Wajuru eram tratados como parentes, mas ‘tiraram muito ouro e o levaram por avião’ (Pinto 2009.50).

Em 1930 o SPI começou a demarcar o território da Área Indígena. Nos mapas da época os Ajuru ou Wajuru estavam na margem esquerda do alto Rio Branco ou no rio Colorado. No mesmo ano o SPI estabeleceu um Posto no médio rio Guaporé, e transferiu compulsoriamente parte dos povos para sua colônia agrícola, inclusive 70 Wajuru e Makurap, sendo na maioria jovens masculinos separados das suas famílias (Pinto 2009.30). Os índios revoltaram em 1954 e uma epidemia de sarampo decimou a população. Os Ajuru atuais são descendentes de uma outra geração que desceu ao Posto na década 70 voluntariamente.

Os missionários Bontkes e Campbell do SIL fizeram um mapeamento dos povos da região em 1967 e 1968. Os Wajuru estavam situados cerca de dez km. acima das cabeceiras do rio Colorado com ‘fronteiras de caça’ nos dois lados com os Arikapo e os Tupari (Pinto 2009.29). A FUNAI fez a demarcação da Área em 1976, e uma revista em 1985 para incluir áreas vitais de castanhais e seringais e floresta de caça, e a Área foi homologada em 1996 como a TI Rio Guaporé (Pinto 2009.38). A TI Rio Branco foi organizada em em 1986, porém não vivem lá nenhum Wajuru. Os Wajuru dividem a sua história entre o ‘tempo da maloca’ e ‘ser brabos’ e ‘tempo no meio dos brancos’ e ‘ser amansados’ e a descida para trabalhar nos seringais marcou a divisão (Pinto 2009.54).

Estilo da Vida:
Os Ajuru ou Wajuru têm caraterísticos culturais em comum com os Tupari, Arikapo, Aruá, Japoti, Koatiara, Makurap, Sacarabiat, e outros, um fenômeno que Denise Maldi chamou o “Complexo Cultural do Marico (Pinto 2009.13). A Terra indígena é composta de quatro aldeias: O Posto Ricardo Franco, a Baía da Coca, Baía das Onças e Baía Rica e dois locais: Mata Verde e o Bairro. No Posto estão as casas dos homens Wajuru e suas famílias. Nos outros lugares vivem as outras etnias. As casas têm forma regional de sala, dois quartos e cozinha, com telhado de palha e paredes de pranchas. Estão em fileiras seguindo a margem do rio, por isso a aldeia não têm um pátio central. Todas as casas têm energia elétrica com congelador e algumas possuem televisão. Cada casa têm um terreiro em redor e as mulheres o limpam todo dia. No terreiro criam galinhas, patos e porcos e guardam o pilão para moer macaxeira e fazer chicha (Pinto 2010).

As roças são distantes das aldeias e são divididas dando um espaço para cada casal e muitas vezes o homem e sua mulher trabalham juntos. Plantam macaxeira, milho, arroz, feição, cará, amendoim e abacaxi. O alimento de preferencia é a macaxeira com peixe e carne de caça. As família ganham bolsa família e aposentaria para comprar café, açúcar, óleo e sal e outros produtos industrializados. Os homens caçam por duas ou três noites com espingarda. Eles abrem a floresta e derrubam as arvores das novas roças. As mulheres fazem coleta de frutas, limpam as casas e abastecem água e lenha (Pinto 2010). A chicha é uma bebida fermentada feita de macaxeira, ou no passado de milho, cará ou amendoim. As chichadas acontecem duas ou três vezes por semana. As chichas remetem ao passado do tempo da maloca e guardam um mistério cosmológico, que somente os pajés podem enxergar.

Sociedade:
Conforme Maldi a sociedade Wajuru tinha antigamente quatro divisões não existem mais: Kup diriat (pau ou mato), Kup goviat (urucum), Üpeg iat (urubu) e Üagá iat (sapo). Conforme Pinto existiam três subgrupos entre os Wajuru: Guayurú (‘povo da pedra’) são aqueles que viviam próximos a serra de pedra, que abrigava os espíritos de seus mortos e se consideram os Wajuru verdadeiros. Kündir iat (povo do mato) eram aqueles que viviam no mato como nômades, sem fazer maloca ou roça. Os Wakünan iat (povo da cotia) são um povo preguiçoso por não fazem roça (Pinto 2009.75).

Uma família nuclear ou um casal mora em cada casa. O casamento é quando a filha é entregue à casa do noivo ou quando o casal foge ou a moça é rapta. Os filhos pertencem à etnia do pai. O casamento é patrilocal, ou pelo menos as mulheres mudam de casa enquanto os homens ficam quase sempre no mesmo local. No Posto os casais são na maioria exogâmicos interétnicos. Então quando um casal casar uma filha e a filha passa a morar com seus sogros, isso forma mais um lugar para ir e tomar chicha, e se dizem que os caminhos entre os assentimentos são ‘limpos’ ou ‘cerrados’ conforme a frequência dos convites de chichadas (Pinto 2010). Os Wajuru têm um sistema de virás ou companheiros que podem ser um relacionamento de amizade entre os homens e cria mais de apoio mútuo.

Os Wajuru formam terceiro lugar em tamanho de população, mas ocupam os cargos políticos de cacique da T I e a presidência da Associação Indígena.

Artesanato: Chamado um povo do complexo cultural do marico. Os maricos são cestas/bolsas de fibras de tucum, tecidas em pontos miúdos ou médios, de vários tamanhos. São suportados por uma alça que é cuidadosamente ajeitada na testa, a fim de que o peso seja distribuído pelas costas. Sua confecção é exclusivamente feminina, apesar de serem utilizados por homens e mulheres para transportarem produtos da roça e da coleta, o que é uma atividade majoritariamente feminina. (Silva 2009.13). Os homens trançam esteiras e cestos. Os netos talham o banquinho de pajé para seu avô.

Religião:
Acreditam queos pajés trazem as almas dos céus para uma mulher engravidar e o ‘sangue’ do marido durante o ato sexual é necessário para o desenvolvimento do bebê. Assim o filho é do pai e sua etnia. Depois o nascimento os pais respeitam alguns resguardos de comer carne de caça ou caçar predador, para evitar o roubo da alma da crianças pelos espíritos.

Os espíritos dos mortos são definidos conforme sua maneira de morrer: awariat são aqueles espíritos, parentes, que morreram por doença, e que moram no céu, são o povo do céu; ügupuiat são aqueles que morreram n’água (ügu, água) e vivem lá, são o povo da água; e wãinkoiat são os espíritos que morreram por homicídio, wãinko sendo a alma que virou bicho, espírito maligno que vaga pela floresta (Pinto 2009.73).

Cosmovisão:
O antigo território dos Wajuru, o Igarapé Preto é situado ao pé da serra que conforme os mitos é a maloca dos espíritos dos mortos Wajuru, mas quando uma mulher os amaldiçoou eles foram embora para o céu, e por isso os vivos não puderam conversar mais com seus parentes falecidos, exceto os pajés que ainda puderam entrar em contato.

No começo do mundo os dois irmãos demiurgos roubaram o fogo do diabo que era um urubu-gente. Mas o irmão mais novo não tirou corretamente o fogo e um mundo se incendiou e o irmão mais novo morreu queimado ao pé da serra e depois apareceu o no lugar dele Campo Grande ao pé da Serra. Todas as vezes os Wajuru atravessavam o Campo deviam ficar muito atentos para, perto de uma pedra que parecia uma mãe segurando o filho, se vissem uma criança chorando, não acudí-la, pois o fogo incendiaria seu caminho de novo (Pinto 2009.43). Mais tarde os americanos tiraram o ouro do Campo Grande (Pinto 2009.52).

Os espíritos são os donos do mato, e especialmente dos animais e por isso são perigosos. A onça é o dono também, e por isso os Wajuru dizem que o caçador rouba a caça da onça. Precisa-se observar as regras: Sair para caçar em silêncio, caçar somente no território próprio e só caçar suficiente para a família próxima. Por isso os casais ou homens e mulheres sozinhos voltam da roça, da pesca e da caça, observam um silêncio, sem falar com ninguém até chegar nas suas casas. Depois tomam um banho no igarapé (Pinto 2010).

Comentário:

Bibliografia:

  • DAI/AMTB 2010, ‘Relatório 2010 – Etnias Indígenas do Brasil’, Organizador: Ronaldo Lidório, Instituto Antropos instituto.antropos.com.br
  • HEMMING, John, 2003, Die If You Must – Brazilian Indians in the Twentieth Century, London; Pan Macmillan.
  • PINTO, Nicole Soares, 2010, ‘Waiuru’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo. pib.socioambiental.org/pt/povo/wajuru
  • PINTO, Nicole Soares, 2009, ‘Do poder do sangue e da chicha: os Wajuru do Guaporé (Rondônia)’, Dissertação: Universidade Federal do Paraná, Setor de Ciências Humanas, Letras e Artes Departamento de Antropologia Social Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social (PPGAS) www.livrosgratis.com.br/arquivos_livros/cp149168.pdf
  • SIL 2009, Lewis, M. Paul (ed), Ethnologue: Languages of the World, 16th Edition. Dallas, Texas: SIL International. Versão on line www.ethnologue.com