David J. Phillips
Autodenominação: Pipipã de Kambixuru. O etnônimo Pipipã é afirmado pelo pajé que lhe foi passado pela tradição oral e assumido pela comunidade (Arcanjo 2003.43). Acrescentaram o termo Kambixuru que significa ‘retorno a Serra Negra’ (Arcanjo 2003.121).
Outros Nomes:
População: 1.640 (DAI/AMTB 2010 e FINASA 2006). 2.050 (Arcanjo 2003). A população conforme o DSEI de Pernambuco é – 2000: 591, 2001:606, 2002: 652, 2003: 1.312.
Localização: Pernambuco, a Terra Indígena Pipipã em identificação. Os Pipipã reivindicam terras na Serra Negra e áreas adjacentes que não foram inseridas na T. I. Kambiwá de 31.495 ha, homologada em 1998.
Língua: Português.
História: A ocupação humana da caatinga é provada pelos fósseis humanos até o século IV a C. que incluem os ancestrais dos Pipipã. A ocupação colonial começou no século XVII com a expansão da criação de gado, provocando guerras contras os povo indígenas. Depois os Portugueses tentaram pacificar os índios com o projeto de aldeamento pelas missões. A resistência dos Pipipã provocou o Governador Luiz Lodo da Silva mandar um ataque contra ‘o gentio bravo Pipipans e Paraquiós’ em 1759. Bandeiras contra eles foram organizadas em 1770. Os índios foram forçados a se espalharem pela caatinga.
Um frade italiano, Frei Vidal de Fresarolo, foi encarregado de pacificar os indígenas que incluíram 114 indivíduos dos ‘Pipipam’ em um aldeamento no lugar chamado Jacaré, nas proximidade da Serra Negra. Os Pipipã eram mencionados como os principais habitantes indígenas da Serra Negra. Em 1823 dois fazendeiros expulsaram os Pipipães da Serra para construir sua fazenda. Os índios perderam o direito sobre seu território de domínio. Para resistir melhor se misturam com outros indígenas. Em 1837 houve mais de cinquenta ‘Pipipans’, entre os Umans e Xocós (Arcanjo 2003.46-49).
Os Pipipãs eram considerados extintos por muito tempo, e estão em processo de etnogênese. Durante o século XX se integraram com os Cambiuás ou Kambiwá, nome que significa ‘retorno à Serra Negra’, uma área sagrada aos Pipipãs. Eram aldeados entre a Serra Negra e a Serra do Periquito no início do sécio XIX. Os seus descendentes se autodenominam através de um etnônimo de um povo considerado extinto, os Pipipã de Kambixuru.
Estilo da Vida: Os Pipipã estão em processo de se distinguir dos Kambiwá e têm cinco aldeias reconhecidas:
A Aldeia Travessão do Ouro está no município de Floresta, situada próxima à Serra do Periquito, no km 29 da BR-360. As casas são de alvenaria e de taipa paralelo com a estrada. A população é de 324 indivíduos em 72 famílias. Esta aldeia tem uma escola e um posto de saúde. Tem dois terreiros ativos para os rituais, devido ao conflito entre famílias. É o centro politico administrativo onde moram o Cacique e o Pajé e vivem nela o maior número de pessoas que assume a identidade Pipipã, que se separaram dos Kambiwá (Arcanjo 2003.29).
Na aldeia Faveleira os índios vivem também com não índios e posseiros. O sistema de abastecimento de água para as três aldeias está situada nesta aldeia. Tem também uma escola e um posto de saúde.
A aldeia Serra Negra está situada na Serra, mas está em fase de esvaziamento. Situada no sopé da Serra que é uma área de preservação ambiental de mata umbrófila densa de 1.100 ha. É o lugar do ritual mais importante para os Pipipã com o principal terreiro, o Aricuri, onde se realiza um ritual anual semelhante ao ritual Ouricuri do povo Fulni-ô (Arcanjo 2003.31). A serra é sagrada aos Pipipã onde benzem-se e joelham-se, fazendo o que chamam penitência para dançar o Toré (Arcanjo 2003.35).
Estas três aldeias são dentro do território demarcado como área Kambiwá e consideradas como território tradicional dos Pipipã.
A aldeia Capoeira do Barro é um projeto de assentimento do INCRA e consiste de não índios e foi ocupada recentemente pelos Pipipã. As casas estão em duas fileiras com um pátio no meio em que se realiza o Toré. Vivem também na aldeia um grupo de índios que vieram das aldeias Travessão do Ouro, Faveleira e Serra Negra.
A aldeia Caraíba está situada próxima à Serra do Taiado e ao Serrote do Tamanduá. É a única aldeia que está fora do território dos Kambiwá, não é reconhecida como área indígena. Consiste de quinze casas dispersas pela caatinga com 19 famílias e cem indivíduos. Há também as localidades Jaburu com quatro casas, Lagoa Rasa com três casas e Vassoura com mais três casas. Conhecidos como ‘caboclo’ atualmente identificam-se como Pipipã (Arcanjo 2003.29). Há outra aldeia chamada Alfredo (Arcanjo 2003.54).
Os Pipipã se sustentam economicamente das aposentadorias, benefícios de natalidade, e da pequena produção de artesanato, e da venda de mel de outros produtos coletados no ambiente (Arcanjo 2003.55).
Sociedade: Conforme os Pipipã o pajé é o líder do povo sem necessitar de um cacique, mas desde dos anos 20, pelo sistema imposto pelo SPI e pela FUNAI tem um cacique para a função politico administrativa e atua também o Conselho Tribal, composto de representantes eleitos das aldeias, e um Conselho de Saúde e a Associação comunitária chamada Pau Ferro Grande dos índios (Equipe 2013). Têm um representante dos Professores Indígenas de Pernambuco (COPIPE) (Arcanjo 2003.59). O sistema de compadre é importante para os Pipipã, tanto por batismo Cristão quanto pela fogueira, que é um ritual em que duas pessoas se consagrem compadres em torno da fogueira durante o ciclo junino (Arcanjo 2001.54). As famílias extensas são chamadas ‘raças’ e existem seis raças entre os Pipipã.
Artesanato: Vendem uma pequena produção de artesanato.
Religião: O Aricuri é ritual que acontece uma vez por ano. O terreiro é limpado pelo pajé e alguns iniciados por cravar nas extremidades do terreiro folhas e palhas de ouricuri. O ritual começa no dia 10 de outubro e estende por dez dias. A comunidade deixa a aldeia e as tarefas cotidianas para passar o tempo na mata na Serra Negra. Somente poucas pessoas ficam na aldeia para cuidar dos animais domésticos. No terceiro dias do Aricuri se realiza o Dia das Criança quando somente as crianças dançam o Toré (Equipe 2013).
O pajé é responsável pelas tradições, articular os rituais e para fazer curas. Ele nasce pajé mas alguns alegam que ele é escolhido por reconhecer o ‘encanto’ (Arcanjo 2003.58).
O Toré se realiza a cada quinze dias em quatro terreiros e as aldeias revezam para se responsabilizar pelo ritual. Os índios deitam em redes ou em esteiras em redor do terreiro. Cada dançadores usa o cocar, a cataioba (saiote de fibra de croá) e leva a borduna ou porrete, a maraca e o aió ou bolsa a tira-colo. O centro do terreiro é marcado por um cruzeiro feito da madeira da Juremeira, pau sagrado, da raiz da qual é feita a bebida tomada durante o ritual, conhecida como vinho da Jurema. Quatro fogueiras marca os lados do terreiro. Os homens entram na mata para se reunir em redor de uma fogueira ao lado de um imbuzeiro. O pajé se esconde na mata com seus discípulos e reivindica seus poderes e sua omnipresença, é pela graça de Deus e pela força encantada. A dança é na forma de uma serpente pelos dançadores em filas de três ou quatro. A serpente rodeia o cruzeiro perseguindo sua cauda, com pausas diante do cruzeiro para mudar o ritmo da música. Em alguns rituais é a hora da jurema quando os dançadores tomam o vinho de uma panela ao pé do cruzeiro (Arcanjo 2003.101).
Visto que os quilombos praticam também o Toré não é suficiente para o reconhecimento de uma comunidade como grupo indígena. Os Pipipã não referem ao Toré como ‘dança’, é a música de um Encantado, uma manifestação grupal de homenagem às forças sobrenaturais. É um dos meios de comunicação com o Panteão dos Encantados. Os dançadores agem soltos, não de braços dados como no Dabucuri dos povos Tukano no alto rio Negro, mas com uma postura de contrição ou penitência para com os Encantados. É sempre um ritual sagrado e prova que a comunidade é indígena (Arcanjo 2003.113). Os indivíduos que se afirmam Pipipã acreditam que o Toré é sua religião, cultura, ciência e tradição e sua dança do Toré é diferente da dança dos outros povos, e segue o mesmo passo dos antigos moradores da Serra Negra, o lugar da sua ancestralidade que se externaliza através dos Encantados (Arcanjo 2003.126).
Cosmovisão: A Serra Negro é um lugar de destaque na cosmologia dos Pipipã, com diversos espaços sagrados como: O Pau Oco da Serra, o Pau Ferro Grande, o Pé de Coité, a Pedra da Espia, o Pau d’Alho e a Mata do Ventador (Arcanjo 2003.67). Os Encantados são pessoas que tem deixados esta vida por ‘encantamento’ para ser protetores dos grupos e se apresentam nos sonhos e na Dança do toré (Equipe 2013). Um encantado chave é o ‘Dono da Ciência’, o ‘Lorencinho’, o velho ‘Pajé’ considerado um deus da terra pelos Pipipã. No passado era pajé que recebe um aviso da perseguição do povo. Parte do povo sobreviveu da perseguição por sair da Serra Negra, os que ficaram foram mortos. O ‘Lorencinho’ morreu com cento e nove anos. Ele é no centro do Panteão de Encantados dos Pipipã e emprestou a sabedoria do Pajé Velho ao pajé vivo. Outros Encantos são o ‘Reino da Jurema’, o ‘Reino do Papagaio’ etc. (Arcanjo 2003.80s).
Comentário:
Bibliografia:
- ARCANJO, Jozelito Alves, 2003, ‘Toré e Identidade étnica: Os Pipipã de Kambixuru’, Recife PE, Dissertação apresentada ao programa de pós-graduação em Antropologia da Universidade Federal de Pernambuco.
- DAI/AMTB 2010, ‘Relatório 2010 – Etnias Indígenas do Brasil’, Organizador: Ronaldo Lidório, Instituto Antropos –http://instituto.antropos.com.br/
- EQUIPE de edição da Enciclopédia, 2013, ‘Pipipã’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo. http://pib.socioambiental.org/pt/povo/pipipa/
- HEMMING, John, 2003, Die If You Must – Brazilian Indians in the Twentieth Century, London; Pan Macmillan.