Kaxuyana — Purehno

David J. Phillips

Autodenominação: Purehno (Grupioni 2010). Kaxuyana significa ‘gente do rio Kaxuru’ (Caixeta de Queiroz 2010).

Outros Nomes: Katxuyana, Kachuyana, Caxuiana (DAI/AMTB), Kachuana, Kashujana, Kashuyana, Kaxúyana, Warikiana, Warikyana (SIL).

População: 900(DAI/AMTB 2010). 134 Kaxuyana com 300 Warikyana em 1986 (SIL). 350 (João do Valle Kaxuyana, 2009 em Grupioni 2010).

Localização: Vivemnos rios Imabu e Trombetas no noroeste do Pará. A maioria vivem com os Trió (Tiriyó) e alguns em duas aldeias com os Hixariána no rio Nhamundá(SIL). Duas aldeias deles no rio Cachorro.

Parque Indígena do Tumucumaque no norte do Pará e do Amapá, na fronteira com o Surinam, de 3.071070 há – 27.000 km², abrangendo os municípios de Oriximiná, Almerim, Monte Alegre e Óbidos. É mais antiga que seu vizinho, o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque (3.867.000 há) criado em 2002. Kaxuyana com os Apalai, Akurió, Olaãpi Tiriyó, Txlyana e Wayana, distribuídos em 50 aldeias população total 1.700 (FUNAI 2011).

T. I. Kaxuyana e Tunayana, PA, ainda é em processo de identificação, perto de Santarem . Alguns com os Tunayana, total 153 (FUNAI 2010).

T. I. Nhamundá Mapuera, PA, AM, de 1.049520 ha homologada em 1997 e registara no CRI e SPU. Kaxuyana com os Hixkaryana, Waiwai e Katuenayana, total 2.218 (FUNASA 2002).

O total de Kauxyana nestas Terras Indígenas é 350 conforme o ISA.

Língua: Kaxuyana ou Kaxuiâna da família linguística Karib do Sul (Kaxuiâna SIL) considerada extinta. Falam português e Trió. Assimilado com Trió (Tiriyó ou Tirió) que tem 2.300 falantes no Suriname e no Brasil e há uma atitude positiva sobre o futuro da língua, mas não para instrução escolar. Tradução do Novo testamento foi completo em 1979 (SIL).

História: Os Kaxuyana viviam na margem do rio Amazonas, mas migraram rio a cima nos rios Trombetas e Paur de Oeste para escaparem o avanço da colonização (Hemming 2003.762). No século XVI já viviam nos rios Cachorro ou Kaxuru e Ituruahu (Cachorrinho), afluentes da margem direita do rio Trombetas, até 1968 quando sua população estava diminuindo devido às epidemias e falta de assistência médica (Grupioni 2010).

O Frei São Manços viajou subindo o rio Trombetas e encontrou com os Kaxuyana em 1725-28. Depois 1836 e a revolta da Cabanagem, alguns quilombolas vieram para morar no rio Trombetas. Olga Coudreau, a viuva do geografo francês Henri Coudreau, que encontrou com os Wai Wai em 1888, fez um mapeamento dos rios Trombetas, Mapuera, Cachorro (Kaxuru) e Cuminá em 1899 e descobriu os indígenas doentes e deixando suas aldeias devido às doenças levadas à região pelos quilombolas. Esta situação instável provocou guerra entre os povos por toda a extensão do rio Trombetas. Mais tarde os Kaxuyana queixaram dos Kahyana: ‘São terríveis, o horror das tribos’ (Hemming 1987.346).

Na década 20 do século XX tinham uma população acerca 500, mas nesta época foi reduzida a 80 pessoas por uma epidemia de sarampo, introduzida pelos castanheiros. Os Warikana e Kahyana foram extintos na mesma época por malaria. Em 1953 o antropólogo Protásio Frikel os visitou quando a população era 60 (Hemming 2003.762).

Para sobreviver um grupo de 50 pessoas se resolveu a migrar para a Missão Tiriyó, no alto Paru de Oeste e outra família de 7 pessoas se mudou para morar com os Hixkaryana, na aldeia Kassauá no rio Nhamundá, e em seguida mudou-se rio abaixo para Cachoeira Porteira (Caixeta de Queiroz 2010). Nos anos 80 a demarcação da Terra Indígena Nhamundá/Mapuera (homologada em 1997) e os casamentos com os Hixkaryana fez a população crescer para formar duas aldeias suas chamadas Cafezal (74 pessoas em 2002) e Areia. A aldeia Areia teve a liderança de Kanahtxe, um Kahyana casado com uma Kaxuyana. Entretanto alguns do outro grupo deixaram a Missão Tiriyó em 2009 para retornar ao rio Cachorro e fundou a aldeia Santidade. Por sua vez isso atraiu um grupo do rio Nhamundá para deixar a aldeia Cafezal e formar a aldeia Chapéu em 2010 com 28 pessoas.

Eles perderam o uso da sua língua por algum tempo, as crianças sendo alfabetizadas em Tiriyó. Eles tinham aprendido o português há muito tempo dos quilombolas e seus descendentes no meio rio Trombetas, com quem também fizeram comércio de castanhas do Pará. Atualmente os líderes estão encorajando a própria idioma. Depois trinta anos fora da sua terra muitos estão regressando ao rio Kaxuru (Cachorro) no meio Trombetas com oito famílias em três aldeias, duas no rio Kaxuru e uma no rio Trombetas (Grupioni 2010). O Amazon Conservation Team (Equipe de Conservação do Amazonas) trabalhou com os Kaxuyana para fazer um mapeamento do Parque Tumucumaque, usando GPS portáveis em 2009. A equipe de vacinação da Coordenação Regional da Funasa no Amapá realizou cobertura em 71% das 50 aldeias localizadas no Parque do Tumucumaque em 2005.

Estilo da Vida: Os Kaxuyana cortam suas roças e derrubando as arvores em setembro e depois fazem a coivara e plantam as manivas em outubro ou novembro; os homens cavam e as mulheres plantam. De três em três meses as mulheres fazem a limpeza da roça de mutirão. A colheita é em julho a setembro conforme o tipo de mandioca. Vendam a farinha, bananas e castanhas do Pará.

Durante o verão o povo depende da pesca. Eles organizam a caça só no inverno quando os animais de caça estão gordos depois de engordar durante o verão. É permitido caçar um animal que aparecer por acaso no verão e quando faltou peixe na pesca. Caçam anta, queixada, veado, paca, macaco e aves. Em outubro coletam ovos de tartaruga, mas não comem o animal (Grupioni 2010).

Sociedade: Antigamente as aldeias tinham apenas duas casas grandes, uma dos homens onde ficaram os solteiros em cima de dez anos e os homens casados durante o dia. A outra maloca, do chefe, era para as esposas, filhas e os meninos menores de dez anos. Os homens passaram o dia com os jovens na sua casa, mas a noite foram para dormir com suas esposas. O chefe ficava na casa das famílias. Com as mudanças de lugar este sistema é descontinuado. As mulheres prepararam a comida juntos (Grupioni 2010). O chefe organizava todas as atividades da aldeia.

Religião: Os Kaxuyana preservam um antigo e primitivo próprio conceito monoteísta do universo combinado com um xamanismo para controlar os espíritos. O Supremo Ser Purá criou todas as coisas e forças que são personificadas pelos espíritos. (Frikel 1971.3). No princípio do mundo havia um sol fixo em cima da terra e iluminava os primeiros homens, e o céu como um firmamento em baixo deste sol não existia, e havia só dia perpétuo e nunca noite. O sol Purá dava luz, vida e alegria contínuas (Frikel 1991.12). Os Kaxuyana consideram isso o paraíso que é afastado do mundo, empurrado para cima pelo céu atual. Atualmente Purá está em cima do céu e não visto mais e seu lugar é tomado pelo sol atual que move atravessa o céu. O sol atual representa Purá, mas pertence a Totóya, que apaga a luz do sol e atravessa o céu para o leste durante a noite e ascender a luz de novo no dia seguinte.

Outra ideia é que o sol atravessa o mundo subterrâneo apagado por uma camada de água que separa os dois mundos. Ainda mais o sol gira em redor do mundo, sem apagar, mas os Kaxuyana não conhecem o movimento da terra ao redor do sol. Estes mitos representam um progresso em entender o mundo. Frikel interpreta que o monoteísmo do criador foi transformado em panteísmo ou pan-dinamista no qual Purá é identificado com as coisas e forças da sua criação, e a crença original tornou-se sem vida própria (Frikel 1991.10).

A terra é o meio do universo, plano e circular e os Mariháyana, vindo do mundo subterrâneo, trouxeram o sol atual e mudaram todos os costumes da terra, especialmente o conceito do universo. O Purá foi humanizado e identificado com a natureza, e ele introduziu a agricultura e a nova religião xamanista.

Os mitos falam da imigração de vários grupos humanos para o continente americano (Frikel 1991.10). Esta mudança de povos era causada pela mulher peixe ou Mataú, que trouxe seu povo, os Mariháyana, com ela. Eles, por forças mágicas, empurraram o firmamento Kahu (o céu atual) para cima que escondeu Purá o sol fixo do paraíso. Agora existe o dualismo entre dia e noite, vida e morte, felicidade e a miséria, uma explicação do bem e o mal (Frikel 1991.14). O nascente, o zênite e o poente correspondem a vida humana, ao nascer, ao viver e ao morrer.

Os mortes estão enterrados em posição de cócoras com o rosto virado para o nascente, na expectativa firme de renascer no paraíso recuperado de Purá, que existe ainda alem do zênite. Mas Purá julga os mortos que chegam e aqueles que ficam permanecem como as criaturas dele, o conhecendo com ‘Nosso Pai’ ou ‘Nosso Chefe’, em um relacionamento pessoal sem os aspectos panteístas, que prevalecia na terra, quando era o ‘paraíso perdido’. Os mortos julgados indignos do paraíso são os assassinos, ladrões, os maus feiticeiros. São mandados ao poente do paraíso onde experimentam uma vida no escuro e sombras (Frikel 191.15). Há cerimônias para apagar a culpa. A mulher Kaxúyana pode conhecer textos míticos e certas formas externas do cerimonial do xamanismo, mas nunca lhe é revelada a devida interpretação.

Cosmovisão: No princípio existiam somente os demiurgos Purá e Mura no paraíso nas cabeceiras do rio Cachorro, protegidos pelo pássaro Cancan. Um dia os demiurgos planejavam roubar o fogo de Mutu, esposa do sapo cururu, e conseguiram. Os dois mataram o filho de Mutu e ela fez um grande enchente para se vingar da morte do filho. Os demiurgos sobreviveram por subir um buriti e receberam alimento por um arara até baixaram as águas. Por sua vez fizeram um grande fogo para matar Mutu, mas não o conseguiram. Criaram gente da madeira do pau do arco, mas estes sumiram, engolidos por uma serpente grande no rio. No fim mataram a serpente e criaram os animais de outros paus e os seres humanos de uma madeira fraca, awarahari(taxizeiro). Os Kaxuyana são descendentes destes seres da warahari (Grupioni 2010). Os Kaxuyana contam nos seus mitos que aprenderam toda sua cultura de diversos seres mitológicos. Estes encontros com estes seres aconteceram em lugares específicos no território kaxuyana.

Comentário: A Missão Nova Tribos do Brasil trabalha entre este povo com uma equipe de cinco inclusive Phillips Schuring, que deu valorosa cooperação com este perfil; e dão assistência médica com uma enfirmaria (MNTB).

O monoteísmo antigo dos Kaxuyana deve ser um ponto de contato. Os mitos podem providenciar pontos de contato com a doutrina da criação e o conceito de um paraíso original perdido com um só Deus criador em Gênesis que criou o mundo atual, sem outros entes. Enfatizar a serpente como um animal (Gen. 3:1) evita a identificação da queda com forças mágicas ou sobrenaturais. A queda original era a responsabilidade dos homens e não de Satanás, que ganhou seu poder depois. Nem a criação dos anjos aparece em Gênesis. A retirada do Criador não aconteceu na cosmovisão bíblica, Javé está constantemente agindo nas afazeres humanas, com salvador e juiz. O dilúvio é uma ação de Javé e não uma enchente de Mutu, e é um juízo por causa da maldade humana.

A sobrevivência da humanidade era pela comunicação e providência de Deus e não pela agilidade dos demiurgos. A providência é a atividade direta do Criador cumprindo seu plano de reconciliar o homem, o monoteísmo aplicado no dia em dia e não apenas uma memória. Após a morte o Cristão entrando na casa do Pai e para estar com Cristo substitui o Paraíso do Purá. A ressurreição final dos santos afirma o paraíso da criação restaurada.

Bibliografia:

  • CAIXETA de QUEIROZ, Ruben, 2010, ‘Hixkaryana’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo, SP, Brasil. pib.socioambiental.org/pt/povo/hixkaryana.
  • DAI/AMTB 2010, ‘Relatório 2010-Etnias Indígenas do Brasil’, Organizador: Ronaldo Lidório, Instituto Antropos –instituto.antropos.com.br.
  • FRIKEL, Protásio, 1971, ‘A Mitologia Solar e a Filosofia de Vida dos Índios Kaxúyana’, Belem, PA: Museu Paraense Emílio Goeldi, In Estudos sobre línguas e culturas indígenas, Sarah C. Gudschinsky (ed.). pages 103-142. Brasília: Instituto Linguístico de Verão. www.sil.org/americas/brasil/SILbpub.html.
  • GRUPIONI, Denise Fajardo, 2010 ‘Kaxuyana’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo, SP, Brasil. pib.socioambiental.org/pt/povo/kaxuyana.
  • HEMMING, John, 1987, Amazon Frontier-The Defeat of the Brazilian Indians, London: Pan Macmillan.
  • HEMMING, John, 2003, Die If You Must: Brazilian Indians in The Twentieth Century, London: Macmillan.
  • SIL, 2009, Ethnologue: Languages of the World, Lewis, M. Paul (ed.), Sixteenth edition. Dallas, Tex.: SIL International, www.ethnologue.com.