Krahô — Mehim

David J. Phillips

Autodenominação: Mehim é usada, mas denomina o qualquer povo indígena. Os que vivem no sul se chamam Mãkrare que significa ‘filhos da ema’ (Rhea americana) (Melatti 1999). Este último nome reflete o predominação do serrado no seu território.

Outros Nomes: Craô, Kraô, Krahó, Timbiara, Mehim (DAI/AMTB 2010). A forma do nome, Krahô, é muito usado pelos não Krahô, porém é baseado em um desentendimento das anotações de Nimuendajú; mais correto conforme a pronuncia é Crahó (Melatti 1999).

População: 2.184 (DAI/AMTB 2010), 2.463 (FUNASA 2010). População da T.I.: 2.989 (Funasa (2010). Durante o século XIX e o início do século XX o povo absorveu grupos de outras etnias, inclusive brancos e quilombolas. Melatti contou 564 em 1962-3 e mais que 632 em 1971 (Melatti 1999). Em 1999 era 2.000. Os Krahô absorvam membros dos Põrekamekra em 1814, dos Kenkateyê em 1923, alguns Apanyekrá e Xerente e também alguns Krahô têm antepassados negros e brancos (Melatti 1999).

Localização: Na margem direita do rio Tocantins, no Estado do Tocantins, entre os afluentes rios Manoel Alves Grande e Manoel Alves Pequeno que forma a Terra Indígena Kraolândia, 302.533 ha., homologada em 1990, no municípios de Goiatins e Itacajá (TO).

Língua: Timbira Oriental. Uma idioma da família linguística Macro-Je, Je Noroeste que tem cinco divisões. Krahô é uma do grupos Timbira com os Canela, Gavião do Pará, Kreye e Krinkati-Timbira. Usado em cinco comunidades no Maranhão, sudoeste do Pará e em Tocantins (SIL).

História: Os Krahô viviam no começo do século XIX no rio Balsas, afluente do rio Paraíba, no sul do Maranhão, e sofreram conflito com os criadores de gado avançando do Nordeste (Melatti 1999). Eles atacaram uma grande fazenda e foram atacados de represália por uma bandeira de 150 colonos que tomaram uma aldeia do Krahô de surpresa e levaram 70 índios presos (Hemming 1995.182). Depois isso começaram a ter relações mais pacíficos com os civilizados (Melatti 1999), especialmente com José Pinto de Magalhães, que fundou a cidade de Carolina.

Entre os Timbira, os Apinagé no começo tiveram boa relações com os Portugueses, comerciando farinha e outros produtos até com Belém, porém eles sofreram mal tratamento pelos soldados e eles tornaram inimigos dos brancos, e em 1813 Magalhães, o fundador de Carolina, considerou que o único meio para dominá-los foi pela guerra (Hemming 1995.181). Mas depois uma epidemia de varíola eles perderam a vontade de guerrear e em 1822 eram aliados com os brancos e com os Krahô em atacar portugueses realistas resistindo a independência do Brasil.

Então os Krahô viviam na margem direita do rio Tocantins, em cima de Carolina, e aliados com os brancos combateram e ajudaram a escravizar os indígenas vizinhos. Tinham uma população de 3.000, mas não aprenderam cultivar algodão, tabaco ou grão. Viajantes descreveram o povo de ser arrasado pelo embriaguez, a cachaça sendo fornecida pelos fazendeiros (Hemming 1995.141, 189). Magalhães teve uma amante Krahô, que o ajudou como tradutora, porém ele a vendeu depois como escrava (Hemming 1995.183). Quando os Krahô continuaram a roubar gado dos fazendeiros Magalhães persuadiu em 1848 o capuchino Frei Rafael de Taggia deslocar os Krahô para um território na confluência do rio do Sono no rio Tocantins. Depois eles migaram para sua posição atual, onde ajudaram um fazendeiro em proteger seu gado das onças e contra outros criadores. Durante o século XIX a população Krahô caiu de 4.000 a 620 em 1852, devido às epidemias em 1849-1850 e 400 em 1930 (Nimuendajú).

Em 1930 Nimuendajú achou 400 Krahô em dois grupos. O grupo do sul recebeu a ajuda de um sertanejo Santo Moreira, que tentou defender a terra dos índios dos avanços dos criadores de gado, mas foi frustrado. Com o créscimo da população branca, os criadores acusaram os índios de roubar gado. Em 1940 um ataque organizado por três fazendeiros de 38 pistoleiros resultou na morte de 26 índios. Um missionário brasileiro batista, Francisco Colares, avisou o SPI e o caso foi levado até Presidente Vargas por General Rondon. O governo processou os assassinos mas foram absolvidos pelo tribunal local. No segundo tribunal em Goiânia onze lideres do ataque receberam sete anos de prisão. Isso deu mais dois resultados positivos; o interventor de Goias delimitou o território da atual Terra Indígena de 320 km. quadrados em 1944 e o SPI estabeleceu um posto. Os Krahô alugaram uma parte da Terra aos fazendeiros em troca de gado, dinheiro ou direitos de caça fora da Terra (Hemming 2003.179). Entretanto o posto do SPI faltou recursos para suprir assistência médica e escolar e falhou em vender a carne das pequenas manadas de gado que o povo tinha. Também nem conseguiu parar as invasões do gado dos fazendeiros (Mellati 1999).

Nos anos 60 Júlio César Melatti estudou os Krahô e observou, com o créscimo da população branca na região, os índios podem manter vidas separadas sem ser empregados nas fazendas e assim manter seus costumes (Hemming 2003.179). O SPI criou gado na Terra Indígena no anos 70 sem os índios receberem nenhum benefício.

O grupo do norte era 50 km distante do grupo do sul e viviam em dois aldeias, que tinham a forma circular de 18 casas. Nimuendajú queixou que os missionários batistas eram tentando modificar a cultura e até proibir as corridas de troncos. A influencia dos missionários provou de ser pouca e quando Melatti estava lá 30 anos depois os Krahô gostavam de batizar as crianças para conseguir padrinhos ricos entre os brancos, mas nada mais. Os índios consideraram os Cristãos divididos em dois: Os católicos bebem cachaça, carregam espingardas, adúlteros, usam palavrão e fumam. Os Protestantes não fazem nenhuma destas coisas (Hemming 2003.180).

Um movimento messiânico surgiu em 1950-51 liderado por Ropkur Txortxó Kraté alias José Nogueira, que começou a receber visões de um vulto branco com barba comprida que representava a Chuva em todas as suas manifestações, nuvens, relampado ou aguaceiro. O alvo dele era punir os Cristãos pelo massacre de 1940, no qual ele perdeu dois parentes, e quis transformar os índios em civilizados. Mandou seus adeptos dançar do modo branco e esperar gado descer do céu e outros produtos na vida civilizada chegar de embarcação. O movimento fracassou em pouco tempo (Hemming 2003.180; Melatti 1999). Hoje os Krahô continuam observar ambas as festas tradicionais e as dos brancos. A Terra Indígena recebeu status permanente em 1990.

Estilo da Vida: A Terra Indígena consiste na maior parte de cerrado com faixas de mata ciliar nas margens dos igarapés. Durante a segunda metade do século XX, com o aumento da população, o número das aldeias cresceu de duas em 1930 até 18 ou 20 no fim do século, todas exceto uma, com as casas em um círculo. A Associação Càpej estabeleceu que um assentimento deve ter pelo menos 70 habitantes para ser reconhecido como uma comunidade.

Um projeto de apicultura e viveiros de plantas para promover o use sustentável do cerrado foi estabelecido entre 2002 e 2004. Casais foram treinados em diversas aldeias e material educacional foi produzido, inclusive cânticos tradicionais sobre o meio ambiente. Porém os projeto não se realizou completamente por falta de recursos financeiros de um dos doadores (Catxêkwyj 2012). O Departamento de Psicobiologia da Universidade Federal de São Paulo SP, conduziu uma pesquisa de noventa remédios usados com entrevistas de sete pajés.

Artesanato: Para o uso doméstico fabricam cestos e esteiras de fibra de buriti e leques, cabaças, cuias. Para a música das cerimônias fazem o maracá feito de cuité (casco da fruta de crescentia cujete), com que o cantor dirige o canto das mulheres. Fazem buzinas, cabacinhas com quatro furos, um cinto de algodão com sininhos sem badalos, que se chocam uns contra os outros, usado na cintura nas corridas ou abaixo dos joelhos por por cantores nos rituais (Melatti 1999).

Sociedade: A forma da aldeia é um círculo das casas das mulheres, o casamento sendo uxorilocal. Novas casas são construídas quando morre o sogro e os genros se separam para formar nova unidades familiares com suas mulheres e filhas ao lado da moradia antiga. Assim a família estendida mantem sua posição no círculo da aldeia, segundo os pontos cardinais, mesmo quando a aldeia muda de localidade. As famílias nucleares habitando uma casa formam um grupo responsável por sua roça e se compartilham juntos dos produtos e da comida preparada (Melatti 1999).

As casas são ligadas ao pátio onde são realizados os rituais. Todo o mundo, homens e mulheres, pertence a uma metade e recebem seus nomes do conjunto de nomes que pertence à sua metade. As duas metades são associadas com o meio ambiente, uma a estação seca, o dia, ao leste e ao pátio central, a outra a estação chuvosa, a noite ao oeste e à periferia da aldeia. Um líder de cada metade, conforme a estação do ano, dirige as reuniões do homens cada dia (Melatti 1999).

Os meninos da mesma idade são formados em graus ou classes de idade sob um nome coletivo, e os graus pertencem alternadamente a uma ou outra metade. Os meninos são colocados ao norte do pátio nas reuniões e empurrados para o sul quando outros graus de meninos mais novos são formados. Outra divisão é entre os homens; é de quatro grupos de cada metade, conforme o nomes do individuo: Os Corujas, Tatupebas, Urubus e Periquito-estrela da metade oriental e da seca e as Raposas, Gaviões, Periquitos e Cupe (‘civilizados’) da metade ocidental e da estação das chuvas. As solteiras pertencem na mesma metade do pai mas depois de se casar na metade do marido.

Religião: Os ritos coletivos são realizados conforme as estações e os estágios da agricultura, o plantio e a colheita do milho, etc.As corridas de toras são realizadas depois as atividade coletivas como as caçadas, pescarias e trabalho de roça. As corridas formam parte os rituais. Cada metade corta sua tora, que é carregada pelos corredores da metade. Há ritos individuais na ocasião do fim de resguardo pelo nascimento do primeiro filho.

Cosmovisão: Os mitos do Krahô contam dos Sol e Lua, que criaram o mundo, os primeiros seres humanos e como estes ganharam o fogo da onça e as plantas agrícolas da mulher estrela. A terra é cercada de água e o céu é sustentado no leste, onde está um acesso ao mundo subterrâneo. O primeiro pajé ganhou seus poderes, depois de ficar doente e foi levado ao céu pelos urubus.

Comentário: A missão WEC antiga, ‘Coração da Amazônia’, seguindo as pesquisas de Sir Norman Grubb, começou um trabalho em Carolina com uma congregação em 1924 entre a população brasileira mas com o alvo de alcançar os Gajaras e os Kayapó. Missionário Bland visitou as aldeias Donzela, Pedra Branca e Pedra Furada dos Krahô em 1925, e foi bem recebido pelos chefes, assistiu as danças do indígenas e uma corrida de toca. Bland anotou o problema da embriaguez entre os índios. Porém este contato não foi proseguido (TWWFJNow May-June 1925).

O pastor Dodanin Gonçalves Pereira da Junta de Missões Nacionais da Convenção Batitsa trabalhou com os Krahô por quase toda a vida e fundou a Casa Batista F. F. Soren. O casal Popjes da SIL publicaram sete livros de leitura em Canela-Krahô, três cartilhas e e dois livrinhos de saúde e higiênica e um dicionário temático canela- krahô – português. Eram responsáveis pela tradução do Novo Testamento e uma parte do Velho.

Bibliografia:

  • CATXÊKWYJ: Uso Sustentável do Cerrado na Terra Indígena Krahô (BRA/02/12) Acessado 12.2011.
  • DAI/AMTB 2010, ‘Relatório 2010-Etnia Indígenas do Brasil’, Organizador: Ronaldo Lidório, Instituto Antropos –instituto.antropos.com.br.
  • HEMMING, John, 1995, Amazon Frontier; The Defeat of the Brazilian Indians, London: Pan Macmillan.
  • HEMMING, John, 2003, Die if You Must: Brazilian Indians in the Twentieth Century, London: Panmacmillan.
  • LIMA FILHO, Manuel Ferreira, 1999, www.arara.fr/BBTRIBOKARAJA.htm.
  • MELATTI, Júlio Cezar, 1999, ‘Krahó’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo, pib.socioambiental.org/pt/povo/kraho.
  • MNTB, 2010, Missão Novas Tribos do Brasil, relatório da equipe.
  • SIL 2009: Lewis, M. Paul (ed.), 2009. Ethnologue: Languages of the World, Sixteenth edition. Dallas, Tex.: SIL International. www.ethnologue.com.
  • TWWFJNow: The Whole World for Jesus Now, antigo Jornal da WEC (Missão Amem), Londres.