Nadëb do rio Negro

David J. Phillips

Autodenominação: Nadëb ou Nadöb que significa ‘gente’ (Gomes 2008.93) e Kabori (Münzel 1969.139). Os Nadëb do Rio Negro da comunidade de Boa Vista se autodenominam ‘Kuyawi’ mas o termo não é reconhecido pelos outros Nabëb (Gomes 2008.76).

Outros Nomes: Nadëb, Nadëb, Kuyawí, Kaborí ou Caboclos das imediações de Santa Isabel do Rio Negro (AM). Há uma clara distinção social entre os Nadëb do Roçado no Rio Uneiuxi e o grupo conhecido por este nomes. Porém não são reconhecidos como ‘Nabëb’ pelos Nabëb do rio Uneiuxi, nem se identificam como parte daquele grupo (Gomes 2008.71).

População: 275 (DAI/AMTB 2010),

Localização: O Estado do Amazonas, na vizinha de Santa Isabel do rio Negro. Os assentimentos dos Nabëb do rio Negro são Ilha do Chile, Boa Vista e outros lugares ao longo do rio Negro e suas afluentes da margem direita como os rios Uneiuxi, Téa e os Igarapés Monte Alto, Aiquari e outros (Gomes 2008.71).

A T. I. Rio Téa de 411.865 ha, homologada e registrada no CRI e SPU, tem 338 habitantes, Desana, Baré, Pira-tapuya, Tukano e Nabëb (FUNASA 2007).

Os Nadëb do Rio Negro são espalhados em 2008 entre diversos pequenos assentamentos no lado direito do rio Negro perto e rio acima de Santa Isabel do Rio Negro, os maiores sendo as comunidades de Boa Vista, Tabocal do Uneiuxi e Igarapé Aiquari (Gomes 2008.87). Vivem em pelo menos oito comunidades ao longo do médio Rio Negro e seus afluentes, os Uneiuxi e Teá:

Bom Jardim- 2 famílias, 11 pessoas.

Boa Vista – 13 famílias, 105 pessoas.

Filis – 2 famílias 12 pessoas.

Sítio Igarapé Aiguari – 5 famílias, 33 pessoas.

Ablanai – 2 famílias, 10 pessoas.

Ilha do Chile -2 famílias, 19 pessoas.

Sítio Igarapezinho Monte Alto no Rio Negro – Uma família, 8 pessoas.

Ilha Otrão – uma família, 9 pessoas.

Santa Isabel do Rio Negro – uma família, 3 pessoas.

Tabocal do Teá – ?

Tabocal do Uneiuxi – 9 famílias, 105 pessoas ).

Estão presentes na aldeia do Roçado, no Jutaí no Paraná Buá-Buá(Gomes 2013.8

Língua: Nadëb, português. A língua Nadëb é usada pelos mais velhos. As línguas dominantes são: Nheengatu e Português. Para a maioria das crianças e jovens a preferência é o português, e a educação escolar é o português e os pais já não ensinam mais a língua tradicional (Gomes 2008.93).

História: É possível no passado remoto que os Nadëb do Rio Negro e os Maku Nadëb do Roçado no alto rio Uneiuxi eram clãs do mesmo povo. Eram nômades caçadores coletores, mudando de lugar em acampamentos conforme as oportunidades de caça e pesca. Foram os menos atingidos pelos ‘regates’ para escravização os índios (PIB 1999). Os Nadëb do Rio Negro viviam nas cabeceiras do rio Téa e seu afluente Igarapé Embori no lado direito do médio rio Negro. Tinha o nome de tá nooh buuj (‘morador da boca’). Um viajante austríaco os encontrou no rio Téa em 1831 e fez uma lista de vocabulário. Eram chamados Kaborí por Münzel em 1969, para os distinguir os ‘bravos’ com menos aculturação. Mas a origem do termo ‘kaborí’ é ‘órfão’, explicado pelos índios, quando foram atacado pelos brancos um apanhado pediu por sua vida dizendo que era órfão (Gomes 2008.77).

Os Maku Nadëb do Roçado os chamam Nadëp e há uma diferença física (Gomes 2008.79). Os Nadëb do Rio Negro da comunidade de Boa Vista se autodenominam ‘Kuyawi’, o termo que os Baré usavam por eles, e é usado pela sua parentela, porém não é reconhecido pelos outros (Gomes 2008.76). Os Nadëb do Roçado (‘bravos’) atacaram os Nadëb no Téa (Nadëp ‘mansos’), matando alguns. Também os do Roçado conta sobre um guerreiro dos Nadëp que se casou com uma moça do Roçado e depois fez feitiço para o sogro, que uma cobra mordeu. Na batalha resultante morreram quatro dos Nadëp e dois dos Nadëb do Roçado (Gomes 2008.83).

Os Nadëb do Rio Negro trabalharam junto aos índios dos rios nas suas roças etc., e nos sítios dos regionais em troca de alimentos e produtos industriais e com os comerciantes regionais. Começaram a visitar o rio Negro em busca de produtos como açúcar possivelmente antes da década 40 do século XX. Existia um varadouro (trilha) entre o alto Téa e o Uneiuxi. Depois um desentendimento com os patrões comerciantes se mudaram para diversos lugares no baixo Uneiuxi. Sofreram uma epidemia de gripe em 1945 e mudaram rio acima para a fazenda Bom Jardim no rio Negro e depois moraram em alguns lugares no rio Uneiuxi e alguns para o rio Jurubaxi (Gomes 2008.83).

Atualmente vivem espalhados ao lado de comunidades indígenas ou ribeirinhos regionais no rio Negro e na cidade de Santa Isabel do Rio Negro. São miscigenados com índios Baré, Tukano, Baniwa, Desano e Kuripako.

Sendo próximos aos brancos regionais estão em um processo de aculturação forçada e sofrem a insegurança psicológica de identidade. Hoje em dia não existe mais o sistema de regatões que exploraram por trocar artigos industriais por seus produtos, mas ainda vivem endividados aos ‘patrões’. A maioria falam o português e a Língua Geral e somente alguns velhos falam a língua Nadëb. A tendência é para as crianças falar só o português devido à educação escolar. Perderam também sua história (Gomes 2008.75).

Estilo da Vida: A denominação ‘Maku’ ou ‘índios da floresta’ refere a sua tendência viver nos divisores das águas entre rios, seguindo uma vida nômade de caçador e coletor dos frutos do mato. Vivem nas margens de floresta perto das campinas entre os rios. Os grupos entre o médio rio Negro e os Japurá são chamados na região Guariba, Xiruai ou Kabori e Nedöb (Cabalzar 2006.48). Mas os Nadëb do Rio Negro, estando nos rios maiores, podem ser considerado pescadores e coletores, mas as oportunidades de caçar sendo limitadas. Em contraste com os demais grupos de Maku usam canoa e motor de rabeta.

As casas abrigam uma família nuclear composta de pai, mãe, filhos solteiros e ainda alguns parentes com tio solteiro, viúvas, sobrinhos, avó materna. Em algumas casas habitam dois ou mais grupos domésticos, especialmente, os genros com seus filhos. A língua Nadëb não distingue entre tapiri e casa e talvez isso seja devido à vida nômade. A construção é da forma regional mais simples, a parte na frente muitas vezes sem paredes com um quarto fechado, sem janelas na parte atrás. As casas estão construídas em palafitas, muitas sem paredes, mas quando têm são de barro, cascas de arvores, tábuas ou jirau de palha. O telho é de palha ou raramente de zinco. Para o acampamentos de caça ou pesca, são feitas coberturas sobre quatro paus suportando um teto de palha ou lona (Comes 2008.93).

Fazem viagens de pesca que duram semanas, e como os demais Maku fazem acampamentos de tapiris. Diversos métodos de pesca são usados, anzol, cacuris, redes linha e zagaia. Não usam mais a tinguijada (com timbó). Vendem algum peixe com regionais e em Santa Isabel (Gomes 2008.90).

A coleta é praticada e os principais itens coletados são: bacaba, açaí, pupunha, patauá, castanha do Pará, tucumã, jatobá, cucura, ingá, maracujá silvestre, cará do mato, mel de abelha e ovos de tartaruga. A caça é praticada de maneira mais incipiente conforme o lugar onde estão, por exemplo quando vão ao rio Teá (Gomes 2008.91)

Aprenderam a agricultura dos índios do rio e plantam duas roças, uma de plantio e a outra de colheita e conhecem quinze tipos de maniva. Também cultivam macaxeira, cará, batata-doce, abacaxi e banana. O serviço é dividido entre os homens fazem a derrubada e a coivara e as mulheres o plantio, limpeza e colheita. Coletam no mato cipó e piaçaba para os patrões (Gomes 2008.91). O grupo doméstico tem autonomia e não precisa de consultar os outros com seu planos de viajar, etc. Cada família é responsável por sua alimentação e quando uma espingarda é tomada emprestada a caça pertence ao dono da arma e uma só parte da carne é dada ao quem caçou. Uma caça ou pesca abundante pode ser compartilhada com os afins (Gomes 2008.91).

Sociedade: Os Nabëb são um de seis grupos de Maku: Outros são Dâw no rio Negro, perto de São Gabriel da Cachoeira; Yuhupdeh entre os rios Tiquiê e Traira, afluentes do rio Uapés; Hupda no lado esquerdo do rio Uapés, Nukak na Colômbia, Bara ou Kakwa no rio Uapés e na Colômbia. Também há os Maku do Japurá ou Maku do Guariba na cabeceiras do afluentes no lado esquerdo do mesmo, como o Paraná Boá-Boá. Os Nabëb do rio Negro são o segundo grupo de Nabëb distinguidos dos Nabëb do Roçado. A ausência de um denominador étnico gera os problemas do desligamento com sua terra natal, a auto desvalorização cultural em face da ausência de uma identidade definida e aceita, e pro fim a ausência de apoio publico governamental objetivo (Gomes 2008.72).

Em comparação com os Maku Nadëb do Roçado, os Nadëb do Rio Negro são um grupos muito instável, devido aos conflitos no grupo local e a busca de sustentação, mas demonstram hoje a tendência de voltar a conviver com seus parentes e se casar entre os outros Nadëb. Da população de 298 em 2008, sete dos dez dos assentamentos contem apenas uma ou duas famílias. O casamento é endogâmico e matrilocal, que é contrário à prática de outros grupos de Maku. Primos cruzados bilaterais é o par ideal para o casamento (Gomes 2011.1). O casamento entre primos paralelos não é permitido. A miscigenação com os índios do rio é comum, mas neste caso a cultura do outro povo predomina. Há mães solteiras abusadas por viajantes e abandonadas.

Em 2013 as comunidades consistem de dois a 8 grupos domésticos ou grupos de fogo, cada grupo doméstico formado pelos casal e seus filhos solteiros ou casado com genro ou noras, netos ou agregados como tio solteiros, viúvos ou algum afim. Assim as comunidades variam entre 12 a 40 pessoas. Somente Boa Vista é maior com cerca de 120 pessoas. Moram ao lado de indígenas Tukano e Arawak e ribeirinhos (Gomes 2013.8).

A liderança dos grupos é no grupo doméstico e não na comunidade, mas antigamente possuíam um tipo de capitão que tratava as relações exteriores e um homem para organizar as festas dabucaris (Gomes 2008.90, 93). Mas estas são realizadas mais para as visitas de não indígenas (Gomes 2011.3). Antigamente os Nabëb do Rio Negro haviam clãs, cada um possuía um nome de um animal associado mas as novas gerações não se lembram mais (Gomes 2011.1).

O plano é conseguir o reconhecimento dos Nadëb do Rio Negro como um povo distinto e rio Téa como sua terra indígena. A T. I. Rio Téa de 411.865 ha tem 338 habitantes, Desana, Baré e Nabëb. Para os últimos é importantíssimo manter as oportunidades de continuar a vida nômade com bastante território para caçar, coletar e pescar; a homologia foi feita pelo decreto de 14 de abril de 1998 e ‘destinada à posse permanente dos grupos indígenas Maku-Nadâb, Tukano, Desana, Piratapura e Baré . .’ (Cabalzar 2006.121).

Artesanato:

Religião: Mas entre os Nabëb do Rio Negro o benzimento é usado em todas as áreas da vida como a solução para as doenças e para a proteção. Os perigos nos rios vêm com os espíritos das águas como o boto e a lontra. Também os espíritos dos mortos podem causar doenças (Gomes 2011.3). O jurupari e os ritos de passagem não são praticados mais. São individualistas, fatalistas e aéticos e a própria experiência do aquém é que importa (Gomes 1911.2). Algumas famílias valorizam as rezas católicas (Gomes 2011.3).

Cosmovisão:Os Nabëb do Rio Negro falam de vulto chamado Sëëw que vivia sozinho com seu filho que era o provedor deles, que é sobrenatural e invisível mas eles não têm uma percepção de um criador e este ser é remoto, sem nenhuma interação com o povo. Não há conceito de responsabilidade moral para com o sobrenatural (Gomes 2011.1). O alem das morte não é definida. A força da vida é a força impessoal e central do cosmos e controla a vida, mas a magia é a mediadora das soluções para os problemas da vida (Gomes 2011.3). Havia dois heróis chamados Ee Taah Paa e Wets Wii que deram origem a os seus clãs.

Comentário:A Missão Coração da Amazônia (ramo de WEC) projetou alvos para alcançar os povos indígenas em 1924, inclusive os Maku do lado direito do rio Negro (TWWFJN July 1924). Uns mapeamentos eram feitos mas nenhum trabalho estabelecido. A analise da língua começou com Joe e Lillian Boot da SIL, e iniciaram com os Nadëb do Rio Negro na comunidade Primavera do Rio Uneiuxi. Entretanto devido a mistura com a Língua Geral mudaram para o ‘Roçado de Bill’ no alto Uneiuxi. Nos anos 80 Helen Weir propôs a ortografia e produziu um dicionário. A língua tem dezessete consonantes e dezessete vogais e dois dialetos do Rio Negro e do Roçado, com diferenças de vocabulário e pronuncia. Rodolfo e Beatrice Senn continuam este trabalho, melhorando a ortografia e produzindo material de alfabetização. A tradução da Bíblia está em caminho com o Novo Testamento completo e 30% do Velho (Gomes 2008.94).

Maria Gomes do Pro-amazônas têm trabalhado desde 2007 entre os Nabëb do Rio Negro, com um programa de educação. O exemplo do projeto de alfabetização e a recuperação das estórias do povo Ticuna em Manaus demonstra a importância para a auto estimo e identidade de uma etnia dominada por uma cultura alheia. A Constituição de 1988 garante aos indígenas o acesso à alfabetização em suas línguas maternas. O analfabetismo é alto entre eles. Em comparação com os do Roçado os Nadëb do Rio Negro estão espalhados de mais para ter uma escola entre eles, para a qual um mínimo exigido é 15 a 20 alunos. Algumas famílias passam meses no ano perto da cidade para os filhos aproveitar a escola, e depois voltam para os lugares onde mantêm suas casas e roças. Gomes propôs e produziu uma cartilha para alfabetização e letramento no dialeto Nadëb Rio Negro (Gomes 2008.99).

Bibliografia:

  • CABALZAR, Alosio, 2006, (redator) Povos Indígenas do Rio Negro, uma introdução à diversidade socioambietal do noroeste da Amazônia brasileira, São Gabriel da Cachoeira/ São Paulo: FIORN-ISA.
  • DAI/AMTB 2010, ‘Relatório 2010 – Etnias Indígenas do Brasil’, Organizador: Ronaldo Lidório, Instituto Antropos –instituto.antropos.com.br.
  • GOMES, Maria Rodrigues, 2008, ‘Nadëb do Rio Negro – Quem foi e quem é?’, Revista Antropos – Vol. 2, Ano 1, Maio de 2008. Instituto Antropos –instituto.antropos.com.br.
  • GOMES, Maria Rodrigues, 2013, ‘IDENTIDADE E ESTIGMA: Os Rearranjos Identitários dos Nadëb do Rio Negro’, tese apresentado ao curso de especialização Lato Sensu em Antropologia Intercultural, no Centro Universitário de Anápolis- UniEVANGÉLICA.
  • GOMES, Maria, 2011, ‘Perfil Cultural – Religioso – Nabëb do Rio Negro’, artigo não publicado.
  • PIB 1999, Equipe de edição da Enciclopédia Povos Indígenas no Brasil, ‘Nadob’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo. pib.socioambiental.org/pt/povo/nadob./
  • SIL 2014, Lewis, M. Paul, Gary F. Simons, and Charles D. Fennig (eds.). 2014. Ethnologue: Languages of the World, Seventeenth edition. Dallas, Texas: SIL International. Online version: www.ethnologue.com.
  • TWWFJN 1924, The Whole World for Jesus Now, London: Worldwide Evangelization Crusade, July-Aug.