Tiriyó – Tarëno

David J. Phillips

Autodenominação: Wü Tarëno que significa ‘eu sou daqui’ ou tarëno, ‘o povo d’aqui’. Aceitam ‘Tiriyó para se identificar em português para pessoas de fora não-Tiriyó.

Outros Nomes: Trio, Pianokoto, Marachó, Tiriyó, Tirió, Tereno, Trió, Tarona, Yawi, Piano, Wu Tareno, Txukuyana, Ewarhvana.,

População: Brasil: 1.156, Suriname: 1.400 (DAI/AMTB 2010), 1.464 (Brasil PIB).

1400 no Suriname, 900 no Brasil (SIL), 1.464 (FUNASA 2010), 1.845 (Ellen-Rose Kambel 2006). A população total estimada em 1908 por De Goeje era 800, mas diminuiu nas décadas 60 -70 a 600/700 (Frikel 1970), cresceu novamente 1.350/1.550 (Fajardo 1992) e 1.760/2.000 (Fajardo 1997) para mais de 2.000 atualmente (Grupioni 2003).

Localização: Vivem com os Katxuyana e Txikuyana na faixa oeste do Parque Indígena do Tumucumaque (3.071070 ha) nos estados dos Amapá e Pará. O Parque é com 27.000 km², se sobrepõe ao território dos municípios de Oriximiná, Almeirim, Alenquer e Óbidos. É mais antiga que seu vizinho o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque. Algumas famílias vivem com os Aparai e Wayana no médio e alto rio Paru de Leste. O maior número mora no Suriname nos rios Tapanahoni, Sipariweni e Paroemeu.

Língua: Trió (SIL) da família linguística Karib do Norte, Guiana Leste-Oeste, Wayana-Trio. A atitude é positiva para com a língua, mas não é considerada apropriada para o ensino escolar. Alfabetismo 10-30%, na segunda língua 25-50%. Novo Testamento completo em 1979. Um livro de frases Tëhtëke panpira. 1981, Paramaribo: Instituut voor Taalwetenschap. vi, 134 pag.Pianokotó era um dialeto provavelmente extinto (SIL). Os Tiriyó vivem em um ambiente multilinguístico com grupos Tupi e Aruak representados com os outros Karib, e também os Africanos fugidos das plantações e inglês, holandês e português (Grupioni 2003).

História: Os grupos dos Tiriyó eram conhecidos primeiro no século XVII, mas ficavam mais ou menos isolados dos brancos até o contanto com os missionários nos anos 60 dos século XX. Mantinham redes de troca, aliança e guerra entre si e outros grupos indígenas como os Aramixó, Aramayana, Akuriyó, Pi(y)anokotó, Saküta, Ragu, Yawi, Prouyana, Okomoyana, Wayarikuré, Pianoi, Aramagóto, Kirikirigoto, Arimihoto, Maraxó Todos considerado se Tarëno, mas com a chegada dos missionários protestantes no Suriname e dos franciscanos no lado brasileiro todos tornaram conhecidos com Tiriyó no Brasil e Trio no Suriname.

A questão da fronteira exata entre a Guiana Britânica e o Brasil surgiu devido ao fato que Frade José dos Santos Inocentes estabeleceu sua Missão entre os Makuxi em território considerado britânico em 1840 e o protestante Youd teve que se retiram do território considerado do Brasil com os protestos dos Wapixana. Para resolver as negociações sobre a fronteira era decidido fazer um mapiamento a região como os irmãos Schomburgk. Estes fizeram uma viagem em 1843 e atravessando a divisa das águas no lado brasileiro contataram os Wai Wai, Pianokotó e outros Tiriyó. Ao princípio os Pianokotó fugiram mas depois os receberam em sua aldeia. Eles descobriam este índios de ter uma fisionomia impressionante e todos era pintados vermelho e bem decorados com colares de contas e ‘cintos bem tecidos de algodão pelas mulheres, igual ao tecidos europeus’ (Hemming 1987.328).

No século XVIII escravos africanos de três etnias fugiram das plantações de cana na Guiana Holandesa para as florestas da Guiana Francesa, eram chamados Negros Marrons ou Meikoro pelos Wayana. Os Africanos se estabeleceram nas margens do rio principais e começaram a comerciar os bens europeus com os Wayana e Tiriyó no meio e alto rio Paru de Leste e por sua vez trocavam bens com os Aparai no sul no rio Amazonas e os Waiãpi a leste. Com comércio dos Negros Marrons, sendo na posição intermédia exploravam os indígenas na troca. Mas no final de século XIX os Wayana e Aparai se ganharam com o comércio para com outros povos indígenas no Brasil (Barbosa e Morgado 2003).

Depois 1900 Olga Coudreau descreveu os índios da região em processo de desintegração. As florestas em baixo das cachoeiras dos rios eram desertas dos indígenas devido à escravidão e às epídemas. Os Negro Marrons tentaram escravizar os índios e as aldeias tinham defesas contra ataques vindo dos macambos ou quilombos, que cresceram em poder com os fugidos da repressão da revolta da Cabanagem no anos 30 do século XIX. Um velho Pianokotó contou Coudreau que o acerca de 1875 um Negro estabeleceu um acampamento de quilombolas e capturou muitas mulheres tiriyó forçando as trabalhar sob chicotadas. Os Tiriyó resgataram as mulheres mas o Negro as capturou de novo. Afinal os índios mataram seu opressor. Outros Negros tentaram fingir amizade e mataram alguns e depois fugiram rio abaixo no rio Cuminá para escapar as represálias (Hemming 1987.343).

No princípio do século XX (1913-16) William Farabee alcançou os Pianokotó e os Tiriyó e foram bem recebidos. Mas os homens de uma aldeia Parikotó (Pianokotó) os receberam inicialmente com flechas prontas para atirar, mas depois os hospedaram por quinze dias. Quando a expedição chegou em uma aldeia Tiriyó na cabeceiras do rio Paru de Oeste o chefe os recebeu com um discurso e Farabee respondeu, nenhum dos dois entendendo as palavras do outro. Serviram muita comida depois, seguido por danças que demonstraram as atividades da sua vida indígena (Hemming 1987.340).

General Rondon encontrou com alguns Tiriyó em 1928. Rondon, sendo um adepto ao Positivismo, não gostou como os missionários católicas e protestantes tentaram suprir as necessidades dos índios em vez do SPI, mas a verba da órgão governamental era cortada nos anos 30. Entretanto a Constituição do Novo Estado em 1934 continha princípios sobre uma politica de territórios indígenas (Hemming 2003.210). Os Tiriyó mantinham comercio de troca com os Mekoro, os africanos fugidos ou quilombolas no lado de Guiana Holandesa. Frei Protásio Frikel em 1950 e 1952 visitou três destes grupos e permaneceu entre os Aramagóto em 1958-1959, e quando a FAB construiu uma pista de avião ao lado assim começou ‘Missão Tiriyó’ no alto Paru de Oeste. Ao mesmo tempo duas missões se estabeleceram no lado surinamesa e muitos Tiriyó eram atraídos para atravessar a fronteira.

Os salesianos pediu Coronel Camarão da FAB expelir a a missão UFM (MEVB- registrada na época até 1972 como Cruzada de Evangelização Mundial da original Missão Coração da Amazônia) da Roraima, mas o Coronel Camarão recusou, porque na área os missionários eram mais efetivos em se dedicar ao bem estar dos índios. O coronel apoiou o trabalho dos franciscanos alemães entre os Tiriyó no rio Paru de Oeste e persuadiu Protásio Frikel transferir-se para os Tiriyó em 1959. Nos anos 70 Protestantes norte-americanos converteram os Tiriyó no Suriname (Hemming 2003.265). Mas os índios interpretaram as diferenças entre do dois ramos do Cristianismo se uma maneira interessante. Não entenderam porque os católicos toleraram as festas, danças e bebidas enquanto os missionários da UFM proibiram estas tradições. Os índios concluíram que os franciscanos não eram mestres completos da religião! Depois algum tempo os padres responderam por intensificar sua instrução religiosa. Frikel considerou a concorrência entre os dois ramos do Cristianismo uma desgraça.

Os Franciscanos mantinham assistência médica excelente e a população cresceu de 200 a 380. Uma epidemia de sarampo foi bem tratado e 60 índios pegaram a doença nenhum morreu. Também por 1982 nenhum dos pajés praticaram mais e as festas eram abandonadas. Outra problema surgiu quando a concentração dos índios vivendo na Missão esgotou a fertilidade da terra da roças em redor do assentimento (Hemming 2003.392). A concentração dos índios era temporária e nos anos 80 voltaram para uma vida mais descentralizada (Hemming 2003.393). A população sofreu uma queda nos meados do século XX, mas com a assistência médica prestada pelos missionários protestantes depois 1965 no Suriname e os católicos no Brasil ela continuou a aumentar (Grupioni 2003). O Governo do Estado do Amapá e FUNASA começaram a dar assistência médica e escolar. Hoje a Associação dos Povos Indígenas do Tumucumaque (APITU), fundada em 1996, tem convênios para facilitar esta assistência. Uma campanha de vacinação da Coordenação Regional da Funasa no Amapá realizou cobertura de quase todos os índios no Parque em 2007. Quatro funcionários era reféns dos Tiriyó, que reivindicaram a liberação de uma parcela de um convenio entre APITU e a FUNASA.

O Parque Indígena de Tumucumaque foi criado no norte do Pará, entre os rios Marapi, Paru de Leste e Jari e as fronteiras ao Suriname e Guana Francesa. Os índios do Parque vivem em 33 aldeias e estão participando no mapeamento dos locais e plantas utilizadas pelas etnias com a FUNAI (PIA). Outra estimada conta 2.000 indígenas em 50 aldeias das etnias: Akurió 10. Apalai (Aparai) 415 (DAI/AMTB 2010) 398 (PIB).398 (Funasa, 2010), 40 (Eliane Camargo, 2011),10 (Eliane Camargo, 2011). Vivem com os Wayana. Kaxuyana 900 (DAI/AMTB 2010) 350 (PIB), 350 (João do Valle Kaxuyana, 2009). Waiãpi Brasil: 905, Guiana Francesa: 412 (DAI/AMTB 2010).905 (Apina/Funai, 2008) 710 (Tinoco, 2002). Tupi-Guarani,relacionado com povos do baixo Xingu. Wayana, Brasil: 415, Suriname: 400, Guiana Francesa: 800 (DAI/AMTB 2010), Brasil; 304 (PIB).304 (Funasa, 2010), 800 (Lopes, 2002), 500 (Lopes, 2002). Os índios beneficiaram da criação do Parque da Montanhas do Tumucumaque ao oeste (Hemming 2003.394).

Estilo da Vida: O território dos Tiriyó é dividido pela fronteira entre o Brasil e o Suriname e a divisão das águas. Por isso e o fato que os rios têm cachoeiras que dificultam a navegação a região ficava isolada e desconhecida. É cortado por rios que descem para o Oceano Atlântico no norte e outros que correm para o Amazonas no sul. Os afluentes do Amazonas são do oeste para o leste são os rios Marapi, Paru de Oeste, Citaré e Paru de Leste. Os rios que correm para o norte no Suriname são Sipariweni, Tapanahoni e Paroemeu. No Brasil os Tiriyó se concentram em dois lugares: Um no médio e alto Paru de Oeste e Marapi com os Katxuyana e o outro na cabeceira do rio Paru de Leste-Citaré e separados dos Wayana e Aparai no meio curso do rio. Natal é época de caçar jabuti e jacarés (Grupioni 2003).

Sociedade: Antigamente cada aldeia (pata) na população dispersa tinha seu tuxaua (tamutupë) ou cacique (pataentu) e os habitantes (pakoro) se consideram descendentes dos tamutupë, e assim são seus filhos solteiros e suas filhas casadas com os genros. O chefe era considerado dono do lugar da aldeia. Um conjunto de parentes bilaterais (imoitü) pode vivar em duas ou mais pata (Grupioni 2005).

Com a concentração nos três missões as posições de chefe e curandeiro perderam sua autoridade. Os protestantes condenaram a prática de xamanismo e os franciscanos manteram um certo constrangimento em relação com a prática. A geração mais jovem tomou a frente nas relações com os missionários e passou a ser ‘Capitão’ e ‘pastor indígena’. No lado brasileiro e católico surgiu o ‘diácono indígena’.Então ter uma posição de liderança religiosa também trouxe funções politicas.Os franciscanos mudaram a missão para um lugar neutro, 2 km. distantes depois a sugestão dos índios, para que ninguém seja ‘dono do lugar’.Cada parentela tinha um representante que todos estes formaram um tipo de conselho de ‘caciques’.No Suriname o pregador evangélico tornou-se o líder também com poder de aplicar a disciplina eclesiástica. Mas nos anos 80 a FUNAI começou a atuar na região e a nova geração escutou as criticas acerca dos motivos dos missionários franciscanos e formou outra liderança.

Artesanato:

Religião: As festas tinha a forma de um tipo de diálogo cerimonial entre as aldeias (patahton), seja entre os parentelas (itupü) com foco no tamutupë (chefe de itupü), seja entre as próprias aldeias (patahton). Poem em foco as relações entre membros da aldeia com sua figura do dono de lugar (pataentu). As festas podem ter resultados positivos ou negativos nas possibilidades de trocas matrimoniais ou materiais e por isso podem abrir oportunidades para novos conflitos. Antes da chegada dos missionários, os Tiriyó dizem que as aldeias viviam brigando entre si por causa de ‘fuxicos’, que provocaram desentendimentos dentro de uma pata que causar a cisão do grupo, com uma serie de vinganças e vendetas. Quando o fuxico era entre as aldeias provocava ataques que podia resultar na morte total dos membros de uma das aldeias. Hoje as festas são brincadeiras imitando o passado, quando as mulheres tentam ‘roubar a caça dos caçadores. As festas são a oportunidade de consumir quantidades de sakura, uma bebida de mandioca fermentada, preparada com o beiju pelas mulheres do anfitrião. (Grupioni 2005).

Cosmovisão: Os Tiriyó têm uma cosmologia sofisticada. Kuyuri é o primeiro ser que existiu ou brotou por si mesmo, e sem forma ou semelhança de animais ou de homem porque ele não foi feito mas simplesmente ‘brotou’ da mistura da origem dos tempos. Antes’ dele havia escuridão, silêncio e sem tempo. Ele era a luz que brilhou onde havia apenas escuridão e é a fonte da vida. Ele iniciou e o espácio em uma paisagem terrestre clara, circundada por água e escuridão, mas não tinha tempo porque nada acontecia para ter sucessão de eventos. Kuyuri vivia sozinho, tinha sentidos, voz e vista e não tinha ninguém para enxergar ou com quem conversar.

Não querendo ficar só criou as coisas de barro (takuren) do espácio da luz e breu (warunu) que representava o escuridão de fora. Da mistura desses formou um fluido vital sanguíneo (munu) que toma a forma do fio da vida (warumunu). Kuyuri fez sua mulher do barro como um pote frágil mas com sangue dentro. Assim começou o tempo como o movimento da vida e com a multiplicação de criaturas e o espírito de Kuyuri é transmitido para cada criatura, em um processo de recriação e assim são oto, corpos animados. Os humanos são distinguidos das outras criaturas por ser capaz de referir a si mesmos como oto.

Cada criança é ensinada a manter o espírito de Kuyuri. Ele dá presentes, como comida, àqueles que continuam seu espírito e por sua vez estes dão mais espírito a ele. O princípio é quem dá um presente ganha mais espírito por dar. Kuyuri se revela aos homens por dar ou recusar as condições de vida conforme seu comportamento de coragem e força física para proteger o espírito dentro, que os dá existência.

Yaraware e Urutura representam os princípios masculino e feminino que são complementares. O espirito feminino é associados com a escuridão e o masculino com a luz.

Comentário: A missão UFM (atualmente Crossworld) trabalhou por muitos anos entre este povo, e continua como a MEVA. O primeiro COMPLEI (Conselho de Pastores e Líderes Indígenas) de Roraima foi realizado em 2011.

Bibliografia:

  • DAI/AMTB 2010, ‘Relatório 2010 – Etnias Indígenas do Brasil’, Organizador: Ronaldo Lidório, Instituto Antropos –instituto.antropos.com.br.
  • GRUPIONI, Denise Fajardo, 2005, ‘Tiriyó’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo. pib.socioambiental.org/pt/povo/tiriyo.
  • HEMMING, John, 1987, Amazon Frontier-The Defeat of the Brazilian Indians, London: Pan Macmillan.
  • HEMMING, John, 2003, Die If You Must – Brazilian Indians in the Twentieth Century, London; Pan Macmillan.
  • SIL 2009, Lewis, M. Paul (ed), Ethnologue: Languages of the World, Sixteenth Edition. Dallas, Tex: SIL International. Versão on line: www.ethnologue.com.