David J. Phillips
Autodenominação: Este povo se chamava Xukuru-Kariri em 1938 e se distingue do povo Xukuru de Pernambuco (população: 9.064, T.I. Xucuru e T.I. Xukuru de Cimbres (PIB 2013). O faccionalismo é uma das características marcantes deste povo, que tem sua história marcada por conflitos internos e divisões. O nome já indica que a origem étnica deste povo se deve à união de dois grandes povos originários da região de Pernambuco – os Xukuru e de Alagoas – os Kariri Wakonã. Há uma facção na Bahia e outra em Minas Gerais (Silva 2002.121). Os Cariri têm origem em grupos de sobreviventes que se misturaram ao Wakóna (ou Aconã) e Carapotó na região de Palmeira dos Índios, Alagoas (PIB 2013).
Outros Nomes: Xukuru Kariri, Xucuru-Kariri (DAI/AMTB 2010).
População: 2.652 (DAI/AMTB 2010), 2.900 (FUNASA 2010). Dois grupos de 70 pessoas na Bahia e em Minas Gerais.
Localização: Alagoas, Bahia e Minas Gerais. A maioria vive na T. I. Xukuru Kariri e na cidade de Palmeira dos Índios, Alagoas.
T. I. Xukuru-Kariri de 7.033 ha Declarada, ao norte, leste e oeste da cidade de Palmeiras dos Índios. Populaçã,o: 1.337 Xukuru-Kariri (FUNAI 2006).
T. I. Fazenda Canto, 372 ha Dominial Indígena Registrada no CRI, 2.910 Xukuru-Kariri (FUNASA 2010).
T. I. Mata da Cafurna, 117 ha Alagoas, Dominial Indígenas Registrada no CRI, 455 do povo.
T. I. Quixabá, 16 ha cortada pela Rodovia BA-210, ao norte de Paulo Afonso, BA. Reservada. População: 126 (FUNAI 2003).
A aldeia Xukuru-Kariri de Minas se localiza no município de Caldas, no sul do Estado, 7 km da cidade de Poços de Caldas, MG.
Língua: Falam apenas o português no seu dia a dia. A língua Kariri pertence ao tronco Macro-Jé, família linguística Kariri. Em Minas, num esforço deliberado de reafirmação cultural, eles desejam que em um futuro próximo todo o grupo domine a língua tradicional, e assim, têm o projeto de ensinar a mesma de forma sistemática para as crianças e adultos assim que conseguirem criar uma escola na aldeia (Silva 2002.122).
História: Ao que parece, a família étnica é formada pelos Xukuru-Kariri e os Kariri-Xocó de Alagoas, os Xukuru de Pernambuco, os Kariri do Ceará e os Kiriri da Bahia. É possível que tenham algum grau de parentesco também com os Xokó do Sergipe (Silva 2002.122).
Como o nome já indica, a origem étnica deste povo se deve à união de dois grandes povos originários da região de Pernambuco – os Xukuru – e de Alagoas – os Kariri Wakonã. Isto se deu pela atuação de missões católicas naquela região ainda no século XVIII, que aldeou estes dois povos exatamente no local onde hoje é a cidade Palmeira dos Índios (Silva 2002.121). Os índios Xucuru teriam migrado da aldeia de Simbres (Cimbres, atual município de Pesqueira), Pernambuco, em 1740, devido da grande seca que tinha ocorrida em todo o Nordeste. A presença de indígenas é registrada em documentos desde o século XVIII. Os Xucuru se estabeleceram nas margens do ribeirão da Cafurna, entre as terras da Fazenda Olho d’Água do Acioly e a serra da Palmeira. Os Kariris teriam vindo posteriormente da aldeia do Colégio de São Francisco (atualmente município de Porto Real do Colégio), da etnia conhecida como Waconã (do rio São Francisco) e se estabeleceram, na serra do Cariry, onde construíram uma pequena capela de palha de palmeira no atual sítio chamado “Igreja Velha”.
Acerca de 1770 chegou ei Domingos de São José para evangelizar os índios e conseguiu em 1773 a doação de uma légua em quadro ou 23 km. quadrados para construir um aldeamento. Construiu, com a ajuda dos índios, a capela do Senhor Bom Jesus da Morte. Em redor da capela estabeleceu-se o aldeamento e depois a Vila de Palmeira dos Índios. Os aldeamentos agrupavam em um único espaço diversas etnias. A maioria em Palmeiras eram os Xucurus e grupos de Kariri. Os Kariri era vários grupos de sobrevivente que se misturaram.
Os índios de Palmeira foram recrutados no exercito Imperial e formaram três companhias, duas Kariri e uma Xukuru e alguns lutaram na guerra contra o Paraguai, 1864-1870. A Vila de Palmeira dos Índios tornou-se Plameira dos não índios, pela invasão dos brancos e os índios eram expulsos. Com a extinção dos aldeamentos, as Câmaras Municipais do Nordeste movimentaram-se para apropriar-se de terras contíguas às povoações indígenas.
Através do convívio forçado, que resultou numa miscigenação étnica por meio de casamentos interétnicos, estes dois povos se fundiram nos hoje conhecidos como Xukuru-Kariri. No século XIX houve ainda um forte processo de miscigenação deste grupo, que já se mesclava, com camponeses nordestinos pobres de várias regiões (Silva 2002.121).
Na região de Palmeira dos Índios eles se dividem em três principais facções, em torno das famílias Santana e Celestino. Os Santana são influentes na Fazenda Cafurna, enquanto os Celestino na Fazenda Canto. Na década de 1990, uma cisão destes últimos deu origem a uma terceira facção em torno de Manoel Selestino, ex-cacique da Fazenda Canto. Os conflitos destes grupos culminaram no assassinato do cacique Luzanel Ricardo, sucessor de Manoel no cacicado da Fazendo Canto em dezembro de 1994. Com a intensificação destes conflitos, alguns grupos menores migraram para outras regiões, sendo um destes liderado por Warkanã de D‟Aruanâ, também conhecido como José Sátiro, que assumiu a posição de cacique do grupo que o seguiu.
Quando deixaram Palmeira dos Índios desceram rumo à Bahia onde se alojaram primeiro no município de Paulo Afonso e depois em Botirama. Após alguns anos de instabilidade e conflitos, peregrinando por vários lugares e regiões, o grupo do cacique Warkanã D‟Aruanâ (“onça pintada”) ou José Sátiro, como é conhecido pela sociedade externa, migrou finalmente para Minas Gerais em 1998, onde encontrou terra e paz, buscando se estabilizar tanto política, como sócio, econômica e culturalmente (Silva 2002.122). Em Minas solicitaram à FUNAI a aquisição de uma terra para o assentamento definitivo do grupo. Enquanto a situação estava sendo avaliada, o grupo se fixou temporariamente no município de São Gotardo e finalmente em 2001 foram transferidos em caráter definitivo para o município de Caldas (Silva2002.121). O plano é para o grupo na Bahia se transferir para Caldas, Minas. A família de José Satiro passou a ser conhecida nacionalmente quando seu filhoNena tornou-se lateral, direita de um importante time paulista, o Corinthians.
Em 2013, os Xikuru-Kariri ainda lutam para a demarcação de todo o território da Terra Indígena Xukuru-Kariri em redor da cidade de Palmeiras dos Índios, Alagoas. A FUNAI alegou falta de recursos para a execução do levantamento fundiário da T. I. mas os índios alegaram pressão política, inclusive de dois posseiros invasores da Terra. Os indígenas batalham por sete mil hectares, sendo que o primeiro levantamento da FUNAI dava conta de 36 mil hectares. A redução ocorreu de forma paulatina. O caso ainda está na justiça.
Estilo da Vida: O antigo território indígena em Palmeira dos Índios é bem definida, composta por uma parte de terras planas e outra acidentada que englobava as serras que hoje caracterizam o município. É sobre essa paisagem natural que os Xucuru-Kariri atuam até hoje para prover a sua subsistência, baseada no trabalho rural. As partes mais planas do município estão nas mãos de não índios, divididas em fazendas. (PIB.2013).
O grupo em Minas Gerais vive em um território é em uma região bastante diferente da sua terra tradicional no Alagoas, com uma clima tão distinto. A comunidade soma cerca de setenta pessoas, quase todas parentes. São aliados do grupo de mais setenta pessoas que vive em Paulo Afonso, na Bahia. A aldeia Xukuru-Kariri de Minas se localiza no município de Caldas, sul do Estado, na região da cidade de Poços de Caldas. A aldeia está numa fazenda a 7 km da cidade de Caldas que dista, por sua vez, cerca de 510 km de Belo Horizonte. Se trata de uma fazenda com 101 hectares, de posse da União, destinada ao assentamento definitivo do grupo. Da aldeia até uma rodovia são apenas 2 km, sendo assim um local de fácil acesso. O grupo fixou residência onde era a antiga sede da fazenda, fazendo uso das residências de alvenaria que já existiam. Segundo o filho do cacique, Clarismõn (sol) também conhecido como Jânio100, o grupo tem costume de morar em cabanas de lona, mas como a região é bastante fria, chegando à noite até a zero grau, faz-se necessário casas de alvenaria, o que inclusive tem retardado a vinda do grupo que ainda está na Bahia, pois não têm condições de construir casas. (Silva 2002.123).
O grupo em Minas tenta vender o artesanato produzido aos visitantes da aldeia e em exposições ou apresentações nas cidades onde vão, mas além da produção artesanal, investem também na produção agrícola de subsistência, “tendo a família nuclear como unidade primária de produção e consumo, coadjuvada por práticas inter-familiares de auxílio mútuo” (Oliveira Júnior.Internet). Os principais produtos são milho, feijão, mandioca e batata-doce, mas desde que mudaram para Minas vêm tendo problemas com a produção. Como a região e clima são muito diferentes, ainda não conseguiram produzir em quantidade satisfatória. Quando para aqui mudaram, perderam toda uma semeadura por ter feito na época errada. Não há indígenas funcionários do governo, como na maioria das outras tribos do Estado, pois não têm escola e a assistência de saúde é recente. Também não têm idosos aposentados, pois o grupo é formado por pessoas relativamente novas. Desta forma, a alimentação é o principal problema que estão enfrentando aqui em Minas (Silva 2002.128).
Sociedade: Os Xakuru-Kariri são divididos em três grupos. O maior de 2.000 pessoas em Palmeira dos Índios, AL, e dois pequenos grupos em Afonso Pena, BA e em Minas. Segundo Oliveira Júnior (internet), em Alagoas, além do cacique e do pajé, o povo conta com liderança do conselho tribal, responsável pela intermediação entre o grupo e o gestor local da assistência do órgão indigenista. Mas como aqui se trata de um grupo reduzido, este último não se fez necessário ainda (Silva 2002.126).
O grupo de Minas tem uma liderança fortíssima na pessoa do cacique Warkanã D‟Aruanâ, também conhecido como José Sátiro, o qual possui uma notável capacidade de articulação política, não apenas dentro do grupo, mas também começa a ter na sociedade regional. Com uma expressiva oratória, tem sido convidado para dar palestras em vários locais e em reuniões importantes. Em junho de 2002, foi convidado para palestrar na Universidade Federal de Viçosa, quando a mesma realizava uma semana de palestras sobre a questão social. Tem participado ativamente do movimento indígena e dos encontros relativos à questão indígena em nível estadual e nacional, construindo rápida e boa relação com as outras etnias do Estado. Desponta-se também a liderança do vice-cacique Clarismõn, também conhecido como Jânio, que sendo filho do cacique Warkanã está sendo preparado pelo pai para assumir futuramente a liderança do grupo. Este é jovem ainda, mas também com um notável poder de articulação e liderança. Conhecedor da língua, da religiosidade, dos costumes culturais que preservaram e aprendendo com o pai as artimanhas políticas tanto internas como externas, tem substituído Warkanã na liderança do grupo quando este se ausenta, bem como em encontros e até palestras quando o mesmo não pode comparecer. A esposa do cacique e mãe de Clarismõn, a índia Tãira, ou Josefa, também tem exercido liderança sobre o grupo, na ausência do seu esposo e do seu filho. O pajé do grupo ainda está na Bahia, mas em negociação de transferência para Minas, com o restante do grupo (Silva 2002.126).
Artesanato: Produzem artesanato em abundância tanto para enfeites ou uso pessoal, como para comercialização. Dentre os muitos, podemos citar variados tipos de lanças, arco e flecha, maracás, vários tipos de chocalhos, abundantes e variados colares, principalmente de sementes, madeira e coco, saiotes de capim, muitos enfeites de pena, sutiãs diversos, gamelas e outras vasilhas de madeira, e várias peças feitas de asas secas de pássaros. Ao contrário de alguns grupos, eles valorizam este material produzido, colocando as vezes até preços exorbitantes nos mesmos (Silva 2002.128).
Os Xukuru-Kariri possuem um estilo de enfeitar o corpo muito peculiar e curioso, se destacando dos demais grupos do Estado. Enquanto alguns grupos pintam apenas o rosto – como os Maxakali – ou também os braços – como os Pataxó – eles pintam todo o corpo, do tornozelo ao pescoço, e também o rosto. Usam uma tinta preta, feita de jenipapo para pintar o corpo com formas geométricas diversificadas, tinta esta que fica impregnada na pele, pois estão sempre retocando. No corpo usam sempre a cor preta, enquanto no rosto usam vermelho. O vermelho simboliza o “sangue derramado” dos seus bravos guerreiros que no passado morreram defendendo o seu povo, e o preto simboliza “luto” pelos muitos que morreram. Enquanto no corpo usam riscos poligonais, no rosto fazem as vezes malhas mesclando o preto e vermelho, ou então riscos horizontais. As mulheres às vezes pintam o rosto com circunferências.
Usam também grandes enfeites de penas que alguns colorem com cores variadas dando um aspecto de singular beleza. Alguns homens usam grandes penas presas ao braço que se estendem até a altura da cabeça e algumas mulheres enfeitam seus sutiãs também com penas. Usam variados tipos de colares e pulseiras, sendo que as mulheres preferem a madeira e sementes, enquanto os homens preferem dentes de animais que eles abateram.
Certamente são os enfeites de osso que dão uma maior peculiaridade aos Xukuru-Kariri quanto aos enfeites corporais. Além dos belos colares e pulseiras de presas de animais, são peritos no manuseio de osso para a fabricação de enfeites variados. Alguns jovens perfuram as orelhas com várias pequenas peças de osso e como brinco usam dentes de duas raízes, sendo que uma perfura a pele. Clarismõn, esposa do cacique, e alguns outros têm o nariz perfurado com três pontiagudas peças de osso. Duas, de aproximadamente 3 cm, perfuram o nariz no sentido vertical, de cima para baixo, ficando duas pequenas e obtusas pontas para cima e duas pontiagudas pontas saindo de dentro das vias nasais. Como suporte destas últimas, uma peça fina, de aproximadamente 7 cm, perfura o nariz em sentido horizontal, deixando uma pontiaguda extremidade de cada lado. Isto lhe confere uma aparência guerreira e feroz.
Em épocas especiais, como nas apresentações ou representações que fazem em cidades, usam sobre suas bermudas um saiote de palha ou de capim, sendo o das mulheres na altura dos joelhos e o dos homens na altura dos tornozelos. Alguns, como Clarismõn, portam ainda uma bela lança de madeira, que lhe confere um aspecto de autoridade (Silva 2002.127).
Religião: Sendo aldeados e catequizados por missionários católicos desde o século XVIII, os Xukuru-Kariri incorporaram em sua religiosidade muitos aspectos do catolicismo, principalmente a veneração de Maria e de alguns outros santos. Consequentemente perderam também muito das suas crenças e tradições religiosas do passado, tornando-se sincretistas com fortes aspectos animistas. Apesar de terem incorporado vários aspectos do catolicismo, fazem questão de distinguir entre este e a sua própria religião. Alguns traços animistas são bem evidentes no grupo e nas suas cerimônias religiosas. Suas crendices são mantidas sob um rígido sigilo tornando difícil uma análise das mesmas. Eles não permitem em hipótese alguma a presença de não-índios nos seus rituais, com exceção de um, o Toré, e são proibidos de relatar os mesmos. Evitam até comentar sobre seus costumes religiosos (Silva 2002.123).
Como se trata de uma cerimônia comum a todos os grupos do Nordeste, o Toré é a única dança aberta a todos e sobre a qual eles têm liberdade de comentar. Consiste numa dança em círculo, quando todos entoam suas cantorias na língua tradicional que se harmonizam com os vários instrumentos usados, marcando compasso com o pisar forte no chão. O líder do grupo inicia a dança e todos o acompanham, usando instrumentos como o maracá, flauta e os que o grupo dispuser. Como andam sempre com o corpo pintado, para o Toré, bem como para qualquer outra cerimônia, se enfeitam com uma indumentária apropriada para o momento. Sempre que são convidados para fazer apresentações em escolas ou qualquer local público, é o Toré que exibem. Parece que este ritual possui mais um aspecto folclórico do que propriamente religioso (Silva 2002.123).
Os rituais sagrados são mantidos em absoluto segredo e nem mesmo os nomes são revelados. São realizados num local sagrado dentro da mata onde não-índios não podem em hipótese alguma se aproximar. Falando dos rituais dos antigos Kariri do São Francisco, Prezia (2000.156) menciona o Warakidzã, como um dos rituais sagrados deste povo. É provável que haja rituais semelhantes ou relacionados ainda hoje, mas na nossa pesquisa de campo não foi possível constatar e parece não haver nenhuma literatura sobre tais rituais. Durante a festa de três a quatro dias acreditam que o herio, Warakidze, desça da constellação Orion, como um jovem formoso ‘encantado’. É ocasião para a perfuração dos lábios dos adolescentes (Silva 2002.123).
O local sagrado que chama-se oricuri, se localiza na mata e se trata de uma clariera, frequentado por eles apenas nos rituais e os nao índios não tem acesso. No oricuri ele se reunem para descansar, debater assunto que só a nós interessa e buscam as ervas medicinais (Silva 2002.125).
Cosmovisão: Apesar de todo o sigilo, foi possível constatar que eles crêem em uma entidade chamada Dejuá-lhá, à qual atribuem a criação de tudo e o governo do mundo. Afirmam ser o mesmo “deus dos brancos”, apenas com nome diferente. Este ocupa o cume da hierarquia no panteão de entidades que habitam seu mundo espiritual, tendo sob seu controle um número indeterminados de entidades inferiores com as quais eles se relacionam. Estas são mediadoras entre eles e Dejuá-lhá.
Outras entidades veneradas pelos Kariri são: Nhinhó o criador do mundo e do povo Kariri. Badzé ou Padzu, deus da floresta e do fumo que teve dois filhos: Poditã, deus da caça e Warakidzé, deus da chuva (Silva 2002.123).
Apenas de negar que são católicos, há evidencia do sincretismo. Pelo que parece, na figura de Maria está concentrada a influência católica e curiosamente eles consideram Palmeira dos Índios como “Terra do Nosso Senhor” e Minas Gerais como “Terra da Nossa Senhora. Também “Mãe Tamaim” ou “N. S.ª das Montanhas”, uma versão de Maria, santa dos católicos, que foi vista por três crianças em um certo local na Vila de Cimbres, tendo esta aldeia como o lugar de adoração dessa divindade. Outros santos católicos também são venerados pelos Xucurus, porém, com menos intensidade (Silva 2002.125).
Comentário: O grupo em Minas não tinha um trabalho evangélico em 2002. Dado ao caráter sigiloso da sua religiosidade, um estudo profundo da cosmologia Xukuru-Kariri se faz necessário, pois ao que parece, isto ainda não foi realizado nem mesmo do ponto de vista antropológico. Há aspectos animistas profundamente arraigados na sua cosmovisão, o que se constitui um grande desafio a uma abordagem missionária. O fato de crerem que existe um só Deus para índios e não-índios é por demais positivo, pois se Dejuá-lhá se tratar realmente do Deus Verdadeiro, revelado nas Sagrados Escrituras, muita coisas são simplificadas. Se o contrário for verdade, então temos aqui um fator complicador, pois além de tratar com as questões animistas, teremos que desfazer todo um sincretismo que vem sendo alimentado pela cosmologia tribal há séculos.
É evidente que se faz necessário uma teologia da singuralidade de Cristo na mediação entre Deus e o homem, pois tanto na sua perspectiva animista quanto católico-sincretista, há outros mediadores. Nos seus rituais tradicionais há todo um panteão de espíritos que fazem a mediação entre eles e Dejuá-lhá, enquanto nas suas crendices católicas a figura central é Maria.
Um fato curioso e que pode ser uma porta de entrada para sua cosmologia, quem sabe até uma ponte para a pregação evangelho, é a grande ênfase que eles dão ao “sangue derramado”. Na sua visão, o “sangue derramado” dos seus bravos e heróicos guerreiros que pelo povo lutaram no passado tem um valor extraordinário, sendo constantemente lembrados e homenageados. Ouvindo-os falar sobre, ou mesmo citar o “sangue derramado” em suas falas, a impressão que se tem é que há todo um aspecto místico por trás disto. Não seria surpresa se descobríssemos que nos seus rituais secretos há também derramamento de sangue. Talvez uma analogia sobre o sangue de Cristo derramado na cruz do Calvário pela humanidade, tenha um efeito inesperado na sua compreensão do evangelho (Silva 2002.131).
Bibliografia:
- DAI/AMTB 2010, ‘Relatório 2010 – Etnias Indígenas do Brasil’, Organizador: Ronaldo Lidório, Instituto Antropos –http://instituto.antropos.com.br/
- HEMMING, John, 2003, Die If You Must – Brazilian Indians in the Twentieth Century, London; Pan Macmillan.
- PIB (Equipe de edição da Enciclopédia Povos Indígenas no Brasil) 2013,’Xukuru-Kariri’, Povos Indígenas do Brasil, Instituto Socioambiental, São Paulo. http://pib.socioambiental.org/pt/povo/xukuru-kariri/
- SILVA, Cácio Evangelista, 2002, ‘Minas Indígena:Levantamento Sociocultural e Possibilidades de Abordagens Missionárias nos Grupos Indígenas de Minas Gerais’, Viçosa, MG, Dissertação apresentada ao Programa Pos-Graduação da Escola de Missões Transculturais do Centro Evangélico de Missões, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Missiologia.
- SILVA, Cácio, 2008, Fenomenologia da Religião, Anápolis, GO: Transcultural Editora e Livraria.